Biografias são um gênero em alta no gosto dos leitores brasileiros, embora ainda pouco representativas no mercado editorial. Mas seguirão crescendo, porque a qualidade de quem as produz tem melhorado e os perfis dos biografados contribuem muito.
Uma boa biografia tem entre suas principais virtudes trazer valiosas e amplas informações do contexto histórico, de quem viveu no entorno do personagem em foco, iconografia inédita e muitas referências bibliográficas.
Minhas preferidas: a trilogia de Lira Neto sobre Getúlio Vargas (Cia das Letras), um relato incomparável, seja pela qualidade do texto ou pela minuciosa apuração; ‘Rondon’, de Larry Rohter, ex-correspondente do New York Times no Brasil, aquele que revelou (o que já era público e notório) a preferência do então presidente Lula pela cachaça e quase foi expulso do país por isso. Vale dizer: ‘Rondon’ (Objetiva) saiu primeiro nos Estados Unidos e depois foi traduzido para o português; e, finalmente, ‘A viúva Clicquot’, da norte-americana Tilar Mazzeo (Rocco), sobre a jornada da mulher que fundou o império do lendário champanhe Veuve Clicquot.
Duas biografias recentes
Recomendo duas leituras recentes, tão prazerosas quanto agregadoras – ‘Dupla exposição’ (Ediouro), sobre Sérgio Porto, jornalista, humorista, escritor e roteirista de meteórica passagem pela vida, mas com uma herança ainda distante de ser mensurada na devida proporção.
O autor, jornalista Renato Sérgio, não cai na tentação da narrativa cronológica e privilegia uma visão humana do homem que criou personagens como Stanislaw Ponte Preta (seu alter ego) e Tia Zulmira. Um Sérgio Porto tão genial quanto infiel, ora criativo, ora depressivo.
Aos amantes do blues, “A música do diabo” (Belas Letras), dos norte-americanos Bruce Conforth e Gayle Dean Mardlow, desvenda o mistério biográfico de Robert Johnson, numa pesquisa que consumiu – acreditem – 50 anos de trabalho!
Uma imersão que desmente lendas repetidas desde o início do século XX, pelos aficionados do gênero musical que deu origem ao rock’n roll. Afinal, Johnson “vendeu a alma ao diabo” em troca de seu talento incrível? A dupla de autores vasculhou milhares de artigos de jornais, censos demográficos, notas fúnebres, certidões de nascimento, fez centenas de entrevistas, comparando, desmentindo e validando. O acervo de imagens também exibe a realidade de um país e de um povo que preserva sua memória.
Para concluir, a inspirada frase de Lobão, usada por Renato Sérgio no livro sobre Porto – e que diz muito sobre biografias, em especial as autorizadas, sob encomenda e para a conveniência do biografado: “A verdade é uma versão que sobreviveu”.
Até breve!
Carlos Stegemann, escritor por ofício, leitor por compulsão.
A Coluna Literária é ilustrada por Luciano Martins.