Luciano Formighieri escreve artigo sobre os desafios da educação contemporânea, destacando a intolerância, a resistência à inovação, a saúde mental e a importância do diálogo entre escolas, famílias e gestores para construir um futuro coletivo e inclusivo.
Diversos são os formuladores da pedagogia ou ainda de campos similares que escrevem artigos sobre a educação e nos brindam com teses que apontam caminhos virtuosos para a aprendizagem ou, no outro polo, os profetas do apocalipse que veem em diversos elementos educativos uma trama diabólica para desvirtuar as famílias e destruir os lares.
Não pretendo nesse breve artigo apontar soluções ou tão pouco me “adonar” da verdade, mas sim explicitar algumas impressões da vivência que experimentei em uma passagem de quase 06 anos como Secretário Adjunto de Educação de Florianópolis, quando além de aprender pude observar conflitos, afetos, construções nas comunidades educativas e disputas fraticidas que sempre levaram à reveses.
Embates ideológicos: A intolerância que permeia a sociedade atualmente, invadiu a escola!
O ambiente escolar era uma salvaguarda da busca pelo conhecimento, um espaço de debate, de diversidade, onde o livre pensar deveria ser o elemento dominante, mas infelizmente isso se perdeu! A incompreensão dos processos de aprendizagem por amplas partes da sociedade, abduzidas por fundamentalismos, tem criado guerrilhas diárias nas escolas. Temas como diversidade, sexualidade, machismo, racismo, inclusão, segurança e tecnologia, não são debatidos a luz da ciência, ou de entender o significado das práticas pedagógicas na busca pelo conhecimento laico, mas sim como reprodução das batalhas travadas na ágora virtual que se tornou hegemônica na sociedade: As redes sociais.
Corporativismo e inflexibilidade: Outro aspecto importante que presenciei é que grande parte dos nossos professores não aceita a complexidade da sociedade atual e ainda estão presos em processos e incompreensões que já não cabem mais nesse mundo! É preciso ressignificar a gestão democrática na escola. Como podemos aceitar que conselhos escolares sejam compostos por pessoas que são praticamente membros da estrutura institucional da unidade educativa? Se as famílias não são chamadas, de verdade, a participarem do cotidiano da escola como podem aceitar ou se sentir parte do que se implementa? Como falar em gestão democrática quando diretores(as) são eleitos ininterruptamente por 3,4,5 mandatos não permitindo a oxigenação, a renovação das práticas e a participação efetiva do grupo que compõe a unidade?
Aprendizagem e tecnologia: Não há como impedir o uso de tecnologias no processo de aprendizagem! Por outro lado, não precisamos queimar os livros! A difícil simbiose entre a folha de papel e o chip é talvez o novo elo perdido da pedagogia presente e futura! As escolas devem saber conectar a biblioteca com o laboratório de informática, se é preciso dimensionar o uso dos smartphones e aparelhos tecnológicos pelos estudantes, também é verdade que o professor não pode mais explicar o sistema solar com desenho em lousa de cimento com giz, afinal tornar uma aula enfadonha e desinteressante é receita pronta para o fracasso!
Estrutura e insumos: Se faz necessário cuidar da estrutura do ambiente escolar. Uma escola cuidada, equipada, com insumos em dia, não somente melhora o resultado educativo como também aprimora o sentimento de carinho e melhora a autoestima de todos que a utilizam. Claro que existe a responsabilidade da Gestão em fornecer essas condições adequadas, mas também é verdade que quem usa a unidade deve ter cuidado com o espaço.
Saúde Mental: Existem diversos elementos que apontam que aprimorar os mecanismos de saúde mental é uma necessidade perene e cada vez maior. Dos professores, passando pelos estudantes e crianças, até chegar nas famílias, práticas inovadoras e rodas de conversa com profissionais adequados são essenciais. Bullying, violência doméstica, depressão, uso de entorpecentes, todos esses elementos precisam da intervenção e ação efetiva do poder público pois tendem a agravar os conflitos além de interferir na aprendizagem e na vida coletiva em sociedade.
Por fim, nesse breve e generoso espaço, acredito que caibam aos gestores públicos estarem prontos para dialogar com as redes educativas e as famílias, não dá para decidir em gabinetes sem ouvir. Educação é sim a ponte para um futuro melhor, mas ninguém vai conseguir chegar lá em carreira solo.
Luciano Formighieri é ex-Secretário adjunto de educação de Florianópolis.