Para usar o jargão do mercado financeiro, a nomeção de Filipe Mello como secretário da Casa Civil no governo do pai, Jorginho Mello (PL), confirmada nesta quarta-feira, foi precificada ao longo de 2023. A presença do advogado no secretariado foi ventilada antes da posse, quando a opção foi evitar o possível desgaste e acusações de nepotismo dando a Filipe uma posição de “secretário sem pasta”, como escrevi na época. A escolha da Casa Civil recaiu sobre o estreante deputado estadual Estener Soratto (PL), que agora entrega a pasta que formaliza o filho do governador como articulador político oficial do governo estadual.
Nos bastidores Filipe Mello já fazia essa função, mas sempre longe dos holofotes. Passaram por ele as principais articulações do governo Jorginho junto ao parlamento e aos demais poderes, em atuação solo ou em linha com o secretário Cléverson Siewert, da Fazenda, e com o próprio Soratto. As reações a sua nomeação vinham sendo testadas há meses, em um longo processo de vazamentos sobre a mudança na Casa Civil. No início deste segundo ano de governo, Filipe sai da sombra e vem para os holofotes – onde seu trabalho será visto, analisado e cobrado com maior transparência. Em política, para a sociedade é sempre melhor o que é feito às claras.
Não há ilegalidade na escolha, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou posição em 2008 de que para cargos de natureza política não se aplicam as regras contra nepotismo na gestão pública definidas pela própria corte. Na época, os ministros analisavam o caso concreto do governo de Roberto Requião no Paraná, que nomeou um irmão para o secretariado. Mas se não há ilegalidade, há obviamente um dilema moral que Jorginho resolveu enfrentar. Nomear o próprio filho é sempre questinável.
Nesse caso, a nomeação também expõe a dificuldade que o governador e seu partido têm na busca por quadros com perfil de articulação política. Soratto e o ex-líder do governo Edilson Massocco, ambos em primeiro mandato no parlamento estadual, já mostravam essa dificuldade na própria bancada de 11 integrantes na Alesc. Dentro do governo, também não surgiram – afora Siewert, insubstituível na Fazenda – nomes com esse perfil. Haveria Beto Martins, da pasta de Portos, Aeroportos e Ferrovias, mas ele não mostrou apetite algum por essa mudança de posição.
Sem plano B, o nome de Filipe Mello acabou sendo requisitado até mesmo dentro do parlamento. O estilo centralizador de Jorginho dificulta o empoderamento de seus articuladores e os deputados estaduais enxergam no filho alguém que vai poder fazer acordos e compromissos chegarem ao gabinete do governador e serem cumpridos. Pesa a favor dele também o bom trânsito no Judiciário, pela atuação como advogado – especialmente na seara eleitoral.
Ao mesmo tempo, Jorginho de certa forma preparou Filipe para a função. Nos governos de Raimundo Colombo (PSD), indicou o filho para os cargos de primeiro escalão destinados a seu partido (na época, o PL se chamava PR). Foram três pastas ocupadas por ele: Planejamento, Articulação Internacional e Cultura, Turismo e Esporte. O advogado também teve experiências breves na prefeitura de Florianópolis como secretário nos primeiros mandatos de Dário Berger (Administração) e Gean Loureiro (Casa Civil). Ninguém no PL catarinense tem esse currículo.
Se vai dar certo ou não, veremos ao longo dos meses. Hoje, Jorginho não tem alternativa. Em um primeiro momento, o governador assume o desgaste que em poucos minutos ganhou manchetes nacionais. Estava precificado. Daqui por diante, terá que lidar também com uma velha regra informal da política: não se nomeia quem não pode ser demitido. Deve estar precificado também.
Filipe Mello, nos tempos de secretário de Cultura, Turismo e Esporte. Foto: Solon Soares, Agência AL.