Existe uma armadilha inevitável para qualquer apreciador de vinhos: você começa experimentando despretensiosamente uma garrafa aqui outra lá e, quando menos percebe, está pedindo indicações, pesquisando sobre os termos que lê no rótulo e escolhendo destinos de viagens que incluam vinícolas. É um caminho sem volta essa história de “entender de vinhos”.
O fato é que existe um prazer genuíno em estudar, experimentar e, principalmente, falar sobre vinhos. Daquele jeito sem complicação, sem frescura, pura e simplesmente pelo prazer de compartilhar experiências. É difícil não admirar aqueles que estão sempre prontos para fazer uma boa indicação com bons argumentos.
Com uma pequena ressalva sobre os conhecidos enochatos que acabam transformando qualquer conversa em uma oportunidade para complicar o consumo, julgar as escolhas alheias e ostentar rótulos caros já degustados, posso afirmar com certeza: quem entende a beleza do vinho, torna-se uma pessoa mais interessante.
A cultura do vinho envolve muito mais que o consumo de uma bebida alcoólica. Envolve história, economia, política, tecnologia e gastronomia. O vinho ajuda a entender as especificidades de cada povo produtor e nos diz muito sobre nossa essência humana. Afinal, não deve ser por acaso que o ser humano venha se empenhando há milênios na produção e no desenvolvimento desta bebida que serve, essencialmente, ao prazer.
De forma prática, olhando para a vida real de quem compra e bebe vinho com frequência, temos pelo menos três bons motivos para buscar conhecimento sobre esta bebida.
Um. Só quem entende o processo de produção de um vinho é capaz de avaliar o preço de uma garrafa. Se você for capaz de relacionar qualidade de produção e comportamento no paladar, você poderá fazer seu próprio julgamento sobre o que é uma garrafa cara ou barata.
Dois. Apenas aprendendo sobre vinhos você será capaz de detectar quando ele estiver estragado. Acredite, hoje sei que já bebi alguns que não estavam em boa condição porque eu não sabia identificar defeitos. Nem sempre o vinho é originalmente ruim. Às vezes é um problema de produção ou armazenamento.
Três. Suas experiências gastronômicas serão elevadas a um novo patamar quando você compreender as lógicas de similaridade e contraste entre vinhos e alimentos. Aquele jantarzinho em casa ou um prato especial em um restaurante se tornarão ainda melhores com os conhecimentos sobre harmonização.
Mas não se engane: aprender sobre tudo isso exige tempo, dedicação e muita “litragem”. Nos meus primeiros anos como consumidora de vinhos, não me interessava em aprender e ficava satisfeita com um vinho seco colonial – quem nunca? – que vinha diretamente de algum pequeníssimo produtor do Rio Grande do Sul em garrafas pet reaproveitadas. Demorou anos para eu entender que aquele vinho era absolutamente diferente de um vinho fino, a começar pelo fato de serem produzidos com espécies de uvas diferentes.
Demorou também para eu notar que trazia uma palavra tão representativa do mundo do vinho escondida no meu sobrenome. A “cave” que destaco do Cavenaghi para ilustrar o nome da coluna faz parte também do meu processo de aprendizado e encantamento com esse mundo.
E assim como o paladar não retrocede, o conhecimento deixa marcas eternas. Todos os rótulos que experimentei nos últimos 15 anos, desde aquele da garrafa pet, criaram em mim o interesse pela formação Profissional Sommelier oferecida pela Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-SC), afiliada à Association de la Sommellerie Internationale (ASI) com sede na França. Nessa jornada de aprendizado, tive acesso a alguns dos mais incríveis vinhos do mundo e fui orientada por grandes mestres.
Bebi vinhos feitos de uvas podres (super nobres!) e uvas passas, vinhos fermentados em inox, em madeira, em cimento, em barro, vinhos oriundos de todos os continentes do mundo. Com tantas descobertas incríveis, foi inevitável deixar de lado a ideia de que malbec era minha uva preferida. Resumidamente, foi assim que me tornei “a amiga que entende de vinhos”.
É com essa bagagem agregada à minha experiência como jornalista que chego neste novo espaço onde vamos compartilhar conhecimentos sem firulas. Mas aviso: se um dia acreditei na ideia de “descomplicar o vinho”, hoje aprecio exatamente a complexidade desta bebida e tento aprofundar cada vez mais meus estudos para apresentar de forma simples aquilo que é, sim, difícil de entender. É o que farei com meus textos nesta coluna.
Se a sua ideia sobre vinhos se aproxima da minha, pegue sua taça e aproveite. Teremos ótimas conversas nas próximas semanas. Tim Tim!