Marketing digital: enquanto o PT chora, o PL vende lenço

A manchete, estampada na edição do último dia 15 do Estadão, é emblemática: PT recusa evento com big techs enquanto Lula cobra militância influencer e PL multiplica seminários. Ela escancara o abismo estratégico entre dois projetos políticos antagônicos na ideologia e, ao que parece, também na tática da comunicação. Um deles entendeu, há muito tempo, que a guerra pelo poder passa pelo território digital.

Em 2018, muitos atribuíram a vitória de Jair Bolsonaro ao acaso. Outros, à raiva, difusa e coletiva, da política tradicional. Mas a realidade foi bem outra: o bolsonarismo começou a montar um exército digital com anos de antecedência. E isso fez a diferença.

Segundo O Globo, a campanha do então candidato inovou em várias frentes do marketing digital. Um exemplo simples, mas poderoso: operava com uma equipe de dezenas de pessoas que alimentavam milhares de grupos de WhatsApp com conteúdo dirigido como memes, vídeos e frases de efeito. Estava tudo mapeado: formatos, horários e gatilhos emocionais. Uma operação pensada, executada e metodicamente monitorada.

Ah, mas e a onda de apoio espontâneo ao Bolsonaro?” Sim, os apoios foram espontâneos e decisivos, mas as ações foram coordenadas. O melhor dos mundos: quando se une estratégia com mobilização orgânica. Pode crer: não foi sorte. Foi método.

E essa lógica se perpetuou. Enquanto Lula pede, agora, uma “revolução nas redes” e exige que a militância vire influencer, o PT recusa oficinas técnicas oferecidas por plataformas como Google, Meta e TikTok. As empresas se ofereceram para ensinar boas práticas: como alcançar mais pessoas, quais formatos funcionam, como reembalar conteúdos. Mas setores do partido, especialmente da ala mais à esquerda, resistiram. Optaram por ver o gesto como “aliança com o capital”, em vez de enxergar como ferramenta estratégica. O plano foi engavetado.

Enquanto isso, o PL de Bolsonaro realiza seminários presenciais com centenas de participantes, reunindo desde técnicos das big techs até os vereadores bolsonaristas mais midiáticos do país. Carlos Bolsonaro, apontado como o arquiteto digital da vitória do pai, participou do evento em Brasília, assim como Carmelo Neto, Rafael Satiê, Bella Carmelo e outros expoentes da chamada tropa jovem da direita. Todos com milhares (ou centenas de milhares) de seguidores no Instagram e no TikTok. Todos ensinando como prender atenção em três segundos, como transformar trends em discurso político e como cortar vídeos com mensagens simples e diretas. Eles entenderam que treinar é fundamental.

No seminário realizado em Fortaleza, no fim de maio, o cardápio foi além: incluiu impulsionamento, WhatsApp Business, inteligência artificial e deepfakes. E até a sanfona de Gilson Machado Filho, que contou como o pai, ex-ministro de Bolsonaro, “se conecta com as pessoas tocando sanfona” nos vídeos. Parece piada, mas não é. É estratégia de afeto. Ou, se preferir, conexão emocional com o eleitor. E o PL entendeu isso.

O PT, não. Lula, experiente, sente que está perdendo a batalha da narrativa. E está mesmo. Pesquisa Datafolha divulgada em 12 de junho mostra que 40% da população avalia seu governo como ruim ou péssimo, contra 28% que o consideram ótimo ou bom. A comunicação do governo não dá conta de competir com o bolsonarismo que, mesmo fora do poder, ocupa espaço, pauta debates e engaja multidões.

E não se trata apenas de pauta ou ideologia. Trata-se de forma, linguagem e performance.

A esquerda segue acreditando que governar bem é suficiente. Que basta entregar para comunicar. Não é por aí, até porque o governo não está nada bem (mas aí já é outra história). Enquanto isso, a direita sabe que, na era da atenção, forma é conteúdo e que política é disputa de narrativa. E que um vídeo bom vale mais que um dossiê técnico.

Não à toa, até o TikTok virou arena. Enquanto vereadores bolsonaristas dançam, ironizam e fazem política com humor, a esquerda debate se deve ou não aparecer sem paletó. O PL está construindo sua estética digital, e o PT ainda está preso à liturgia do partido de massa. Não sabe se fala com o celular ou com a convenção.

Se nada mudar, a história vai se repetir e a esquerda vai perder. Vai perder por vários motivos, entre eles o fato de ser uma gestão que gera uma crise atrás da outra. Mas, principalmente, por desprezar o território onde o jogo já está sendo jogado (e vencido) faz tempo.

ps: ilustração gerada por IA

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