
Metanol: o copo envenenado do agro
O Brasil não registra apenas recordes de produção agrícola. Infelizmente, também soma um trágico placar de mortes por intoxicação com metanol, presente em bebidas adulteradas espalhadas por diferentes estados.
O “álcool de madeira” que deveria estar restrito à indústria e ao agronegócio — onde é insumo estratégico para biodiesel — vem sendo desviado, caindo nas mãos de falsificadores e se transformando em arma letal.
Da usina ao boteco
O paradoxo é gritante. O Brasil que se apresenta ao mundo como líder em biocombustíveis verdes depende de um produto fóssil, importado e altamente tóxico para sustentar sua matriz energética. O metanol é mais barato, mais eficiente e mais reativo do que o etanol, por isso segue como a rota majoritária para biodiesel.
Mas o preço invisível é alto: insegurança sanitária, dependência externa e contradição ambiental.
O brinde amargo
Enquanto o etanol nacional — renovável, seguro e parte da história agrícola do país — é tratado como coadjuvante, o metanol se firma como protagonista. O resultado é um brinde amargo, que mistura eficiência industrial com tragédia social.
Cannabis: o país do prazo eterno
Na semana passada, a Advocacia-Geral da União e a Anvisa pediram ao Superior Tribunal de Justiça mais 180 dias para regulamentar o plantio de cannabis no Brasil.
O prazo anterior venceu em 30 de setembro, e a promessa agora é que, até abril de 2026, sejam feitas consultas públicas, audiências e elaboração de minuta normativa.
Do STJ para a prateleira
É a segunda prorrogação desde a decisão do STJ, em novembro do ano passado, que autorizou o cultivo com finalidade medicinal.
Enquanto o governo adia, mais de 670 mil brasileiros seguem dependentes de medicamentos importados à base de cannabis — caros e muitas vezes inacessíveis.
Embrapa na espera
A Embrapa prepara pedido para avançar no plantio não só para fármacos, mas também para fibras e alimentos. Mas segue à espera da regulamentação. O Brasil que pode plantar quase tudo, mas continua proibido de plantar o que pode curar milhões de pessoas e também, animais.
Banana: a república do escorregão
Também na semana passada, Brasília foi palco de uma reunião decisiva sobre a bananicultura. Entidades nacionais como Conaban, Abanorte, Abavar e Febanana, ao lado de representantes catarinenses, se reuniram com os ministros Carlos Fávaro (Agricultura) e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário). A articulação foi puxada pelo deputado Rafael Pezenti, de Santa Catarina, que é o maior estado exportador de banana do Brasil.
O fantasma do Mal do Panamá
A pauta foi clara: risco de entrada da banana equatoriana, carregando junto não apenas concorrência desleal, mas também a ameaça fitossanitária do Fusarium TR4 — praga que já devastou plantações pelo mundo e poderia arruinar a banana nanica e a prata, variedades mais consumidas no país.
Safra recorde, preços em queda
Santa Catarina vive um paradoxo em 2025: safra histórica de 768 mil toneladas (17,5% maior que a anterior), área cultivada de 28,4 mil hectares e liderança nas exportações nacionais (21,8 mil toneladas no primeiro semestre, 103% a mais que em 2024). Mesmo assim, produtores veem preços em queda e sentem o peso da decisão do governo federal de abrir as portas para a banana do Equador.
30 mil famílias em risco
São cerca de 30 mil famílias envolvidas diretamente no estado, em sua maioria pequenos agricultores familiares. Alesc e câmaras municipais já aprovaram moções de repúdio. O alerta de Pezenti foi claro: “Não precisamos importar banana. Essa decisão ameaça uma cadeia produtiva inteira e pode custar caro ao consumidor”.
Ironias tropicais
O Brasil do metanol que mata, da cannabis que não anda e da banana que escorrega, insiste em se apresentar como potência agrícola inovadora.
Mas, às vezes, a realidade não combina com o discurso. De um lado, toleramos mortes causadas por um insumo industrial que virou veneno em garrafas clandestinas. De outro, adiamos indefinidamente a regulamentação de uma planta que poderia aliviar a dor de milhares de pessoas. E, no campo, ameaçamos arruinar uma das cadeias mais tradicionais do país em troca de aliviar a supersafra equatoriana.
É uma ironia tropical: o agro brasileiro se vende como futuro, mas ainda segue tropeçando no presente.