
Os números indicam avanço: em um ano, o índice que mede o quanto as empresas brasileiras se dizem preocupadas com a saúde mental de seus colaboradores subiu de 5,06 para 8,19 pontos, um crescimento de 62%, segundo o Anuário Saúde Mental nas Empresas, elaborado pelo Instituto Philos Org.
O dado mostra que o tema deixou de ser tabu e ganhou espaço em relatórios, campanhas e discursos corporativos. Mas o mesmo estudo revela o outro lado da moeda: as companhias estão falando mais sobre saúde mental, e ainda escutando pouco.
O discurso cresce mais rápido que as ações
A pesquisa evidencia um descompasso entre a narrativa institucional e o cotidiano dos trabalhadores. A saúde mental aparece nos relatórios anuais e nas falas de executivos, mas a cultura interna continua marcada por sobrecarga, pressão por metas e jornadas longas.
Na prática, as condições que mais afetam o bem-estar emocional seguem pouco enfrentadas, e, às vezes, mascaradas por iniciativas pontuais, como programas de meditação ou palestras motivacionais.
Quando o tema vira vitrine
O salto no indicador tem múltiplas explicações. De um lado, cresce a cobrança social e regulatória: casos de burnout se tornaram públicos, afastamentos por transtornos psicológicos aumentaram e investidores passaram a exigir transparência em relatórios ESG.
De outro, muitas empresas passaram a abordar o tema de forma estratégica, como um diferencial de imagem. Isso ajuda a colocar o assunto na pauta, mas também cria o risco de que o cuidado se torne apenas uma vitrine.
Coragem para mudar estruturas
Como destaca o fundador do Philos Org, Carlos Assis, a mudança real depende de coragem. Coragem para enxergar o cuidado com a mente como investimento, e não custo. Coragem para rever metas, lideranças e práticas que alimentam o adoecimento.
Oferecer benefícios de saúde mental é importante, mas insuficiente se o ambiente de trabalho continuar hostil. A saúde emocional das equipes depende de políticas consistentes, escuta ativa e revisão de modelos de gestão.
Do número à mudança
O crescimento de 62% na preocupação declarada é um sinal de que algo está mudando, mas ainda de forma superficial. O verdadeiro desafio é transformar esse avanço estatístico em transformação real.
Falar sobre saúde mental é o primeiro passo. Escutar, acolher e agir, esse é o caminho que ainda falta percorrer.