Homenagens não são o bastante. Por Aureo Moraes

Artigo de Aureo Moraes, Professor do Departamento de Jornalismo e chefe de Gabinete do Reitor Cancellier

Desde que perdemos tragicamente o amigo e ex-Reitor Luiz Carlos Cancellier, em outubro de 2017, seu nome foi fortemente marcado na memóriamdos catarinenses, na comunidade da UFSC e em todo o Brasil. Alguns exemplos: Em dezembro de 2017 o Conselho Universitário aprovou a designação do nome do Centro de Cultura e Eventos como “Centro de Cultura e Eventos Reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo”; em 2019, por proposição do
então Senador Roberto Requião, foi sancionada a Lei 13.869, a Lei de Abuso de Autoridade ou “Lei Cancellier”; em 29 de agosto de 2023, a Câmara Municipal de Florianópolis aprovou o projeto, proposto pelo Vereador Afrânio Boppré (PSOL), para denominar “Avenida Reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo” a via pública construída às margens da Rua Deputado Antônio Edu Vieira, que dá acesso à UFSC; antes, em janeiro de 2023, o Presidente Lula mencionou Cancellier no seu discurso em um encontro com reitores de universidades e institutos federais no Palácio do Planalto. Disse o Presidente: “Faz cinco anos e quatro meses que esse homem se matou pela pressão de uma polícia ignorante, de um promotor ignorante, de pessoas insensatas, que condenaram as pessoas antes de investigar e de julgar”.

No dia 15 de dezembro de 2023 foi inaugurado, num espaço próximo ao Centro de Ciências Jurídicas na UFSC – onde o Reitor passou a maior parte de sua vida acadêmica – o “Jardim Cancellier”, com um busto dele em bronze. Na escultura completa, uma das últimas frases de “Cau”: “Minha morte foi decretada quando fui banido da universidade”.

A mais recente das homenagens foi a entrega, pelo próprio Presidente da República, da Ordem Nacional do Mérito Educativo no grau de Comendador a Cancellier, pelos serviços prestados à educação brasileira. O mais
significativo da ocasião foi o fato de que o ex-Reitor foi representado pelo filho, Mikhail.

Ao longo destes oito longos anos também houve registros em livros, documentários em áudio e vídeo e inúmeras reportagens em diferentes espaços sobre o crime de Estado do qual Cancellier e outras dezenas de
pessoas foram vítimas.

No mesmo período o processo iniciado pelas mãos de um corregedor insano, mal intencionado e movido por ódio e má fé, segue tramitando na Justiça Federal. Ao mesmo tempo, outros dos algozes daquela operação tiveram diferentes destinos. A delegada Marena se aposentou, sem a menor nódoa em sua curta carreira; a Juíza Janaína Cassol foi afastada pelo CNJ por condutas incompatíveis e não preside mais o processo; Orlando Vieira de Castro Júnior deixou a superintendência da CGU em Santa Catarina mas continua desempenhando funções naquela instituição; O único ainda associado ao processo é o Procurador André Bertuol, que segue atuando nas
intermináveis audiências que ainda continuam ocorrendo. Foi Bertuol, ao lado de Castro Junior, que ameaçou a então Vice Reitora, Alacoque Erdmann, de que “ela teria o mesmo destino de Cancellier caso não revogasse a portaria que afastava Hickel da função”, em novembro de 2017.

É inegável, portanto, que a morte do ex-Reitor e a violência que o levou àquela decisão permanecem como cicatrizes ou pior, feridas abertas. É igualmente verdade que a insistência de agentes públicos em manter ativo um processo que já demonstrou o quanto foi absurdo, abusivo, violento, arbitrário e, mais grave, sem provas materiais suficientes para sequer prender alguém, siga ferindo tanta gente.

Todos os que foram presos com o “Cau” ainda têm que arcar com os altos custos da defesa; comparecer em juízo para repetir, um sem número de vezes, o que até o TCU e mesmo o promotor Bertuol já disseram: são inocentes, não há provas, não há materialidade…

As demais pessoas, sejam aquelas conduzidas coercitivamente ou os demais indiciados e indiciadas, que mesmo não tendo passado pela humilhante e degradante prisão, ainda vivem o calvário da exposição pública de seus
nomes, a condenação midiática sem direito à defesa.

Ao fim existe somente um final possível para o caso. Para além das homenagens, há que se definir pelo arquivamento de todas as denúncias, pela extinção do processo e pela apuração rigorosa e minuciosa das condutas daqueles agentes públicos que extrapolaram suas atribuições. Com ampla defesa e direito ao contraditório, sem dúvida. Diferente do que eles fizeram com os acusados. E, ao cabo, que se punam os verdeiros culpados pelo único crime que o caso comporta: o assassinato das reputações e das vidas, praticado pelo Estado brasileiro.

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