Marxismo Cultural Contra a Economia Criativa: a Saga do Moralismo Delirante em Santa Catarina. Por Pedro MC

Artigo de Pedro MC, Cineasta e produtor cultural de Florianópolis, reconhecido com o Prêmio Franklin Cascaes de Cultura em 2012, diretor artístico de mostras, festivais e cineclubes de alcance internacional, diretor e roteirista do média-metragem de ficção-científica “Tua Boca é Fogo”

(Sergio Adriano H/Divulgação)

Acompanhar o debate cultural em Santa Catarina, nos últimos meses, tem sido quase como assistir a um seriado — algo entre horror político, histeria coletiva e fantasia conspiratória. 

A diferença é que, enquanto Stranger Things diverte, o moralismo delirante catarinense produz efeitos reais sobre políticas públicas, trabalhadores da cultura e a própria economia do estado.

A criação de pânicos morais virou método político.

Episódios recentes parecem roteiro de sátira:

— Galinha Pintadinha acusada de doutrinação marxista.

— Festival de cinema ambiental denunciado como “fachada” de apoio ao MST.

— Show com artistas negros recebendo parecer desfavorável da Prefeitura de Florianópolis.

— Perfil do Chavoso da USP, convidado do FICA, excluído pela Meta sem justificativa.

A soma desses casos revela mais que desinformação: mostra como a extrema direita local opera uma “guerra cultural” permanente, alimentada por teorias conspiratórias que transformam qualquer ação cultural em ameaça comunista — mesmo que o alvo seja um desenho infantil ou um festival gratuito ao ar livre. São contra crianças assistirem filmes sobre o meio-ambiente. É um delírio. 

Sergio Adriano H e o que realmente coloca Santa Catarina no mapa

Na contramão desse caos simbólico, artistas catarinenses seguem produzindo. O caso mais emblemático é o de Sergio Adriano H, nascido em Joinville, hoje com exposições no CCBB em São Paulo e no MASC. Sua obra, que investiga negritude, memória, violência colonial e invisibilidade, projeta Santa Catarina nacional e internacionalmente — não pelo delírio conspiratório, mas pela força estética e intelectual.

Curiosamente, enquanto o estado ganha visibilidade pela qualidade de artistas como Sergio Adriano H, o debate político insiste em reduzi-lo a caricaturas ideológicas.

Economia Criativa: números que desmontam o pânico moral

E esse moralismo delirante não é apenas politicamente tóxico — é economicamente irracional.

Dados recentes do Ministério da Cultura, da FIRJAN e do IBGE mostram:

A Economia Criativa representa cerca de 3,11% do PIB brasileiro, movimentando mais de R$ 230 bilhões por ano.

O setor emprega 7,4 milhões de pessoas, mais do que a indústria automobilística, farmacêutica e de telecomunicações somadas.

É o setor que mais cresce no mundo, acima de 4% ao ano, segundo a UNESCO.

Em Santa Catarina, segmentos criativos — audiovisual, design, música, games, eventos, artes — têm altíssimo potencial de crescimento, especialmente em Florianópolis, que já é referência em tecnologia e inovação.

Atacar artistas, festivais e instituições culturais com base em teorias conspiratórias não é apenas autoritário: é jogar contra a geração de renda, emprego e competitividade regional.

Diversidade política é saudável. Demonização da cultura, não.

Na democracia, divergências são inevitáveis. Há quem acredite no livre mercado puro, capaz de regular até o setor de streaming sozinho. Há quem defenda políticas regulatórias que protejam a soberania cultural — como fazem França, Canadá e Coreia do Sul. Esse debate é legítimo.

O que não é legítimo é transformar cultura em inimiga.

É usar pareceres para censura indireta.

É aplicar lawfare cultural — hoje menos escancarado do que há 10 anos, na época do importante OcupaMinC, mas ainda assim presente, principalmente na falta de transparência nas avaliações de projetos culturais.

Santa Catarina não cabe no estereótipo fabricado

O estado não é, e nunca foi, apenas a caricatura que a extrema direita tenta vender. Santa Catarina é Sergio Adriano H. É cinema independente. É música preta. É arte indígena. É festival comunitário. É periferia criando, é juventude pesquisando, é universidade produzindo conhecimento.

O que nos projeta não são fantasmas inventados como “marxismo cultural”, mas a vitalidade real da produção artística e da economia criativa.

Defender cultura é defender futuro

Proteger a cultura não é defender um partido.

É defender empregos, renda, inovação.

É defender o direito de imaginar — e construir — futuros possíveis.

Sem amadurecer o debate e as políticas públicas de Cultura, Santa Catarina está a um passo de virar o seriado O Conto de Aia, ou uma fábula nazifascista.

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