Artigo de Paulo Bornhausen, Secretário de Articulação Internacional e Projetos Estratégicos de Santa Catarina

Precisamos ter uma conversa franca sobre o que aconteceu em Brasília, nos últimos meses. Muitas vezes, as notícias que vêm da capital federal parecem não afetar o nosso dia a dia. Mas a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que congelou o número de deputados para as eleições de 2026 (Medida Cautelar sobre a ADO 38) , tem um preço. E eu fiz as contas: a fatura para Santa Catarina é de, no mínimo, R$ 1,6 bilhão.
Deixem-me explicar como fomos passados para trás.
O jogo de cadeiras
A regra da nossa democracia deveria ser clara: onde a população é maior, tem-se mais representantes. O Censo de 2022 mostrou que o Brasil mudou. Enquanto estados como Rio de Janeiro e Bahia perderam população ou cresceram pouco, Santa Catarina explodiu em desenvolvimento e pessoas.
Pela Constituição e pela matemática honesta, Santa Catarina teria direito a mais 4 cadeiras na Câmara dos Deputados. Isso significaria quatro novas vozes para defender nossos interesses, nossa agroindústria, nossa tecnologia e nosso turismo.
Mas, em Brasília, a lógica da sobrevivência política falou mais alto. Os estados que perderiam vagas e poder pressionaram. O Congresso, então, aprovou um aumento de 513 para 531 deputados em 2027, mantendo o tamanho das bancadas que perderiam representantes segundo o Censo de 2022. O presidente da República acabou vetando o PLP 177/2023.
A resposta do Congresso foi, então, recorrer ao STF para impedir a atualização do número de deputados de acordo com a mudança populacional. Como a lei não ficou pronta um ano antes da eleição (o tal princípio da anterioridade), o STF decidiu que, para 2026, tudo fica como está. A mudança, que é nosso direito, foi empurrada para 2030.
Uma intervenção inconstitucional cometida pela corte que deveria zelar pela constituição!
A manobra do atraso
Não se engane: isso não foi um acidente de percurso, mas uma manobra. Deputados de estados que perderiam cadeiras, apoiados por lideranças nacionais, preferiram não mexer no quadro político desenhado hoje. Ignoraram a proporcionalidade real.
Para o “sistema”, é melhor deixar Santa Catarina sub-representada do que tirar o poder de quem já está lá, mesmo que a população desses lugares tenha diminuído. Criou-se uma distorção onde o voto de um catarinense vale menos do que o voto de um cidadão de um estado que encolheu.
O prejuízo no seu bolso
Agora, vamos à parte que não sai na manchete comum, mas que é o meu dever revelar. Política em Brasília se faz com voz, voto e recursos.
Um deputado federal não é apenas um legislador; ele é um canal de retorno dos impostos que pagamos. Através das emendas parlamentares (individuais, de bancada, de comissão), deputados trazem dinheiro para hospitais, estradas, máquinas agrícolas e escolas.
Mergulhamos nos dados do Orçamento de 2024 para calcular o tamanho do rombo:
Hoje, a média de recursos que um deputado consegue movimentar (somando todos os tipos de emendas autorizadas) gira em torno de R$ 101,4 milhões por ano.
Como deixaremos de ter os 4 novos deputados a que teríamos direito, Santa Catarina perde, automaticamente, cerca de R$ 405,5 milhões por ano.
Se multiplicarmos isso pelos quatro anos de um mandato (2027-2030), o prejuízo acumulado é estratosférico, de R$ 1,62 bilhão.
O Que Isso Significa?
Imaginem R$ 1,6 bilhão a menos em obras contra enchentes no Vale do Itajaí. R$ 1,6 bilhão a menos para a saúde, a infraestrutura do Oeste ou para a mobilidade no Litoral. É dinheiro nosso, gerado pelo nosso suor, que vai ficar em Brasília ou ser distribuído para estados que, proporcionalmente, têm deputados demais para gente de menos.
Essa decisão perpetua uma desigualdade regional cruel. Santa Catarina, que puxa a locomotiva do desenvolvimento, continua sendo punida por sua eficiência, enquanto a omissão legislativa premiou a estagnação.
Não podemos aceitar calados que essa distorção dure. A sociedade civil organizada, o setor produtivo e a classe política de Santa Catarina precisam se unir. Perdemos a batalha de 2026 por um tecnicismo jurídico, forçado por uma malandragem política, mas não podemos perder a guerra pelo nosso futuro.
A conta chegou, e é alta demais para ser ignorada.






