
E cá estou eu falando novamente de narrativa na política, uma semana após a inesperada polêmica (e consequente repercussão) do artigo que teve como protagonista o senador Esperidião Amin.
A propósito, se ainda não leu o artigo sobre o senador do Progressistas, é só procurar aqui no site do Upiara.
A minha intenção, nesta semana, era fugir de temas políticos e comentar sobre um estudo que faz uma conexão entre engajamento e voto. A propósito, esse é um dos debates mais estéreis do marketing político: like significa voto?
Pois é. Mas, no meio do caminho, surgiu uma foto e acabei não me aguentando.
O registro fotográfico do encontro de Donald Trump e Luiz Inácio Lula da Silva na Malásia é uma demonstração inequívoca de que, na política, às vezes não é preciso resultado. Basta uma boa foto.
A imagem que rodou o mundo bateu recordes de engajamento (foram 72 milhões de visualizações e 678 mil menções nas redes sociais, segundo levantamento da Quaest) e foi mais poderosa que qualquer pauta da reunião.
Na prática, não houve resultado concreto. Não teve acordos, avanços ou nota conjunta que valesse o tempo de reunião. Mas, no campo da narrativa (que era o que ambos buscavam), foi um sucesso bilateral.
Obviamente, Lula precisava mais do que Trump da mensagem a ser transmitida no pós-reunião.
Mas mesmo o todo-poderoso presidente norte-americano também tinha recados a dar ao mundo.
Isso eu explico a seguir. Por ora, continuemos falando de narrativa.
Podemos afirmar que entramos na era da política pós-texto, na qual as imagens são o próprio discurso.
Gestos, olhares e sorrisos (e eles foram abundantes na foto, transmitindo o “sucesso” da reunião) contam a história antes da palavra. Até porque não havia nada a dizer.
Portanto, nesse sentido, o encontro entre Lula e Trump foi um caso clássico de comunicação performativa, em que o gesto vale mais que o conteúdo.
Nada ali foi improvisado: ambos queriam a foto, e ela cumpriu o papel que a diplomacia não conseguiu. Projetou força, influência e protagonismo.
Mas o nobre leitor pode questionar: que motivos teria Trump para surgir tão sorridente ao lado do presidente esquerdista, do país que ele próprio havia punido com sanções econômicas e críticas ao Judiciário?
Comecemos por Lula.
Para ele, era fundamental (e urgente) mostrar que tem acesso ao homem que é o grande farol da direita brasileira. E sinalizar que é capaz de reverter as tarifas impostas ao empresariado brasileiro.
O clique com Trump é um recado direto ao mundo político e aos eleitores brasileiros: “não sou refém da extrema direita, nem dos que fomentaram retaliações ao meu governo.”
Por ora, no quesito popularidade, parece ter dado certo.
Do lado americano, Trump também sabia o valor daquele enquadramento.
A foto é um recado geopolítico, mais à China do que ao Brasil.
Ao reatar pontes com nosso país, ele coloca um contrapeso à influência chinesa na América Latina, inclusive no próprio Brasil, parceiro estratégico dos EUA.
Trump pode ser ideologicamente alinhado à direita e pessoalmente próximo dos Bolsonaro, mas há algo que fala mais alto do que ideologia para ele: os negócios.
Se o pragmatismo econômico pesar mais que a lealdade política (e costuma pesar), Trump não hesitará em trocar afeto por acordo.
Para ele, o lucro sempre vale mais que o vínculo.
O gesto de ambos, ao posarem juntos e sorridentes, transformou um não-evento em acontecimento.
Por isso, não resisti a comentar essa foto em mais uma crônica sobre as aparências da política. Ela resume o tempo em que vivemos: a diplomacia virou storytelling visual. Ou seja, quando a realidade não oferece resultados, a imagem fabrica o símbolo.
O saldo final do encontro foi esse: Trump não encerrou o tarifaço e Lula não fechou nenhum acordo.
Mas os dois ganharam o que realmente importa na política contemporânea: a narrativa.
A foto funcionou como discurso, pacto e post, tudo ao mesmo tempo. A política moderna é exatamente isso: uma sucessão de imagens que fingem resultados.
E talvez a lição desta semana seja simples: quando não há fato a mostrar, mostre uma foto. O resto, o algoritmo faz.
E, por favor, não cobrar profundidade nessa coluna. O objetivo aqui é colocar o que penso, provocar e sair correndo.
Ps: imagem criada com ajuda da IA, como devem ter percebido.





