A órbita das eleições municipais e o propósito pedagógico da democracia eleitoral. Por Lucas Henrique Rocha Cobalchini

Lucas Henrique Rocha Cobalchini escreve artigo sobre a evolução das eleições municipais no Brasil, destacando a estabilidade política e a maturidade democrática adquirida pelos municípios desde a implementação do instituto da reeleição em 1997.

Em 2020, tivemos um número expressivo de reeleições para candidatos a Prefeito (61%). Em 2024, a prospecção é parecida e atende a um padrão histórico – aumentando relativamente em proporção ao tempo – que remonta à implementação do instituto das reeleições em 1997, quando já haviam passado dois ciclos eleitorais da formulação do modelo político formatado aos municípios brasileiros no pacto de 88. Um desvio estatístico da média apresentada é 2016 (46,8%), a primeira eleição pós-impeachment, naturalmente impactada pela circunstância histórica, que exalava uma forte tendência disruptiva às elites políticas estabelecidas.

Ao analisar não apenas os casos de reeleição, mas também de recondução de programas políticos – nos casos de sucessões apoiadas eleitoralmente pelas gestões –, a falta de dados estatísticos não impede a conclusão lógica de que o número nesses casos é consideravelmente maior. Comparando com as eleições gerais, fica evidente a estabilidade política e as tendências de continuidade características das últimas eleições municipais, em especial as de 2024.

Desde a implementação do modelo eleitoral atual, os municípios brasileiros têm passado por um processo contínuo de absorção de experiência democrática, fortalecendo a capacidade de escolha dos eleitores e, consequentemente, suas instituições. Nos municípios, a autonomia executiva dos órgãos de representação democrática permite ao eleitor reconhecer com clareza erros e acertos. Com mais eficiência do que no cenário nacional, o voto nos municípios converte a vontade em realidade. O candidato apresenta um programa político, submete-se à avaliação eleitoral e, se eleito, tem autonomia para executar o que propôs. Se for eficiente e o programa estiver alinhado com a realidade local, via de regra, a continuidade é garantida; caso contrário, será reprovado nas próximas eleições.

Diferente do modelo republicano que rege o quadro nacional, nos municípios brasileiros temos um desenvolvimento orgânico de um regime político estável e verdadeiramente representativo. No âmbito nacional, raramente um presidente eleito tem autonomia para implementar o programa político pelo qual foi eleito, enfrentando diversos obstáculos, incluindo os mecanismos de pesos e contrapesos. Isso gera uma crise de representatividade e fomenta o surgimento de filosofias reacionárias e a antipolítica, onde grupos excluídos do processo buscam se organizar contra o próprio sistema.

Nos municípios, por outro lado, há um aprendizado contínuo com o processo democrático. As eleições locais promovem o desenvolvimento político das comunidades, resultando em uma maturidade democrática que tende a evoluir nos próximos ciclos eleitorais. Por essa razão, as eleições municipais ocorrem em uma dinâmica distinta das eleições gerais, não apenas por fatores como a proximidade com a esfera de poder, mas pela capacidade de execução dos programas locais.

Entender essa lógica é fundamental para evitar o pensamento contraproducente de que nos importamos mais com a gestão municipal do que com a do país como um todo. Pelo contrário, as eleições municipais refletem um modelo político mais representativo, que traduz de maneira mais eficiente as vontades democráticas, conquistando maior confiança do eleitorado.

Após essa análise teórica, compreendemos que as eleições municipais se diferenciam das gerais porque, ao longo dos anos, as instituições locais têm sido mais eficazes em traduzir os anseios das comunidades, tornando o processo eleitoral municipal mais democrático e respeitado.

Agora, olhando para 2024, surge a pergunta: as pautas nacionais podem sobrepor-se às locais? Baseado nos resultados de 2020 e na análise apresentada, é improvável. No entanto, dado o cenário de polarização social e o ambiente de inimizade que vivemos, a pergunta é válida e a resposta é simples: é possível. Se isso ocorrer, permito-me utilizar a famosa frase do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: “Esqueçam o que escrevi, porque o mundo mudou e a realidade hoje é outra.”


Lucas Henrique Rocha Cobalchini é estudante de Direito e membro da executiva da JMDB.

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