ALESC debate direitos da população em situação de rua em SC

Comissão de Direitos Humanos discute violações e propõe políticas públicas integradas para garantir cidadania e dignidade

 Foto: Jeferson Baldo/Agência AL

Audiência pública reúne instituições para debater situação da população de rua

Uma audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Família nesta quinta-feira (3), na Alesc, discutiu a situação e a violação dos direitos humanos da população de rua em Santa Catarina.

O debate tratou da atuação de diferentes instituições e reconheceu a necessidade da construção de uma política pública conjunta voltada a esta parcela da população.

Atuação do Judiciário e avanços na identificação civil

O representante do TJSC destacou o aprendizado com as oitivas de moradores de rua e as visitas realizadas em conjunto com os membros do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).

“Conseguimos ouvir dores que a gente não conhecia, ouvir esses relatos traz para nós um novo olhar, mas o que se faz de concreto? Estamos aprendendo e estamos tentando”, ponderou o juiz corregedor Maximiliano Losso Bunn.

O membro do TJSC ressaltou a expedição – em apenas uma semana – de mais de mil carteiras de identidade e de certidões de nascimentos para moradores de rua. “Precisamos fortalecer essa rede de serviços e realizar unicamente o que está na Constituição Federal”, defendeu Bunn.

Garantia de direitos eleitorais para pessoas em situação de rua

No mesmo sentido, o juiz Marcelo Volpato de Souza, do Tribunal Regional Eleitoral (TRE/SC), informou que o Tribunal se prepara para o alistamento eleitoral, a regularização e a alteração do domicílio eleitoral dos moradores de rua.

“O TRE está preocupado com a população de rua, que tem direito irrestrito ao voto e isso não pode ser sonegado, mas também para que os candidatos se sintam obrigados a incluir essas pessoas nos seus programas de governo”, justificou o juiz eleitoral.

Críticas à ausência do Ministério Público e necessidade de engajamento

O membro do Conselho Nacional de Assistência Social, Rafael Machado da Silva mencionou visita técnica feita juntamente com outras entidades ao estado para ouvir os moradores de rua. “O Ministério Público em nenhum momento nos acompanhou. No estado de Santa Catarina o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público Estadual (MPSC) precisam sair da posição de conforto”.

O representante do MPSC, Eduardo Sens dos Santos, revelou que um grupo de 12 procuradores trabalha para engajar os demais membros do Ministério Público pela atuação em defesa dos direitos dos moradores de rua.

“Foi um saudável puxão de orelha. Estou há pouco tempo na missão de defender as pessoas que moram na rua e sei que estamos em débito”, declarou Sens, que reivindicou um sistema unificado de saúde e assistência social para quando o morador de rua mudar de município continuar o atendimento sem interrupção.

CNJ destaca importância da cidadania e alerta para violência institucional

A juíza federal Luciana Ortiz, que coordena as políticas para moradores de rua do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), relatou que a visita ao estado teve o objetivo de ouvir as pessoas que moram nas ruas. Ortiz lembrou que uma resolução do CNJ permitiu aos moradores de rua entrar nos prédios do judiciário sem documentação civil, com suas roupas e animais.

“Precisamos superar essa ausência de direitos das pessoas em situação de rua, precisamos conferir cidadania para elas, precisamos dar a identificação civil, a certidão de nascimento, precisamos que toda política pública contemple fluxos que propiciem a essas pessoas terem renda e moradia”, registrou Ortiz, que alertou os gestores para a gravidade da violência institucional.

Denúncias de violações em cidades catarinenses são relatadas

Diego Bezerra Alves, titular do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, ressaltou o recebimento de denúncias de violações de direitos, do cometimento de violências e tratamento discriminatório contra os moradores de rua. Ele citou as cidades de Florianópolis, Criciúma e Joinville como origem de várias denúncias.

“É possível ajudar as pessoas a saírem da rua, mas desde que se mude a concepção, a lógica da repressão e da violência precisa ser revertida para uma lógica de acolhimento, de escuta e a proposição de políticas de moradia, de saúde, de assistência social e de trabalho”, afirmou Bezerra.

Amilton da Silva, coordenador da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, explicou que o órgão tem o papel de ouvir e encaminhar as denúncias de violação de direitos, sendo que a negligência, o risco à saúde e a tortura psicológica são as violações mais recorrentes.

“Na população de rua de Santa Catarina 37% são pretos e pardos, mas os pretos e pardos são apenas 15% da população geral e isso já nos mostra um recorte e uma característica que tem de ser enfrentada”, lamentou o coordenador.

Governo do Estado anuncia programa para moradores de rua

Gabriella Dornelles, diretora de Assistência Social do governo catarinense, informou que a administração estadual prepara um programa exclusivo para os moradores de rua.

“O governo se preocupou em fazer um programa, mas a gente não pode criar algo diferente do que já está posto, a gente tem a assistência social, a abordagem com respeito, o apoio, o consultório na rua, da mesma forma os outros serviços públicos. A ideia é fortalecer esses serviços, investir recursos para fortalecer os serviços e as políticas públicas constituídas”, insistiu Gabriela.

No caso do cadastro da população de rua, cujo projeto de lei deve tramitar na Casa nos próximos dias, Gabriella explicou que o objetivo é conhecer a população, fazer um diagnóstico real para verificar as demandas e direcionar os investimentos, inclusive em benefícios eventuais e moradia.

Moradoras de rua relatam experiências de exclusão e violência

“Me chamam de craqueira, mas não sabem o que eu passei para chegar aqui, o quanto conheci da violência doméstica, do racismo, do abuso infantil aos 12 anos e muitas outras coisas pelas que passei. É fácil julgar as pessoas, mas esquecem que para chegar na situação de rua é um piscar de olhos, é a perda do emprego, da família”, afirmou Laura Dias.

“Eles não constroem nem uma casa para o acolhimento de mulheres, temos uma Casa de Passagem defasada, a Passarela Nego Quirido virou um depósito de gente e está infestada de percevejos e pulgas. As casas de acolhimento dos outros municípios (da Grande Florianópolis) têm uma higiene e alimentação precária”, revelou Aline Salas.

Audiência propõe políticas públicas integradas e divulgação de carta

Marquito (Psol), que aceitou a sugestão do CNAS e propôs a realização da audiência, falou sobre os objetivos do debate.

“A questão dos moradores de rua precisa ser tratada com a responsabilidade, o tamanho e a dimensão que ela merece, não pode ser tratada de forma rasa, rasteira, porque o que está em jogo são vidas, histórias de vida, mas também diz muito sobre a sociedade que estamos construindo”, avaliou Marquito.

Encaminhamentos finais

Ficou decidido reivindicar investimentos para a assistência social, moradia, trabalho, saúde e educação dos moradores de rua; a construção conjunta (poderes e instituições) de uma política para moradores de rua; além da divulgação da Carta de Florianópolis.

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