Após denúncia de vereadora, MPSC vê racismo em vídeo de influenciadores e envia caso à Justiça Federal

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) enquadrou como crime de racismo, na modalidade de xenofobia, um vídeo publicado por um casal de influenciadores digitais de Pomerode. Em despacho assinado pelo promotor de Justiça Jadel da Silva Júnior, da 40ª Promotoria de Justiça da Capital, o órgão declinou da competência e enviou o caso para a Procuradoria da República, por entender que o crime deve ser julgado pela Justiça Federal.

Casal de influenciadores removeu vídeo das redes sociais. Foto: Reprodução.

A denúncia foi feita pela vereadora Ingrid Sateré Mawê (PSOL), de Florianópolis, em 15 de julho deste ano.

A investigação teve início após uma denúncia sobre um vídeo publicado em 10 de julho pelos influenciadores Jenifer Milbratz Cleiton Stainzack, que somam mais de 321 mil seguidores. Na publicação, que viralizou com mais de 5 milhões de visualizações, o casal listou “requisitos” para quem deseja morar em Santa Catarina.

No vídeo, os influenciadores afirmam que o “catarinense é mais sério, mais fechado” e que “odeia preguiça e serviço mal feito”. A polêmica se aprofundou quando abordaram o campo político: “Santa Catarina é conservadora nos valores, nos costumes e nas escolhas políticas. Aqui, a esquerda nunca governou. É por isso que o nosso Estado continua firme, seguro e produtivo”. A mensagem termina com um recado direto: “Se você vem de um Estado destruído pela esquerda e quer recomeçar com trabalho e dignidade, seja bem-vindo. Agora, se você vem com agenda woke, ideologia de gênero e assistencialismo estatal, faz um favor pra todos nós e fique onde está”. 

Após a polêmica, o casal excluiu a publicação e postou outro vídeo. Neles, afirmaram que a intenção era apenas “expressar opiniões sobre a cultura e o modo de vida” que em nenhum momento quiseram “atacar ou menosprezar quem veio de fora ou pensa diferente”. O casal disse lamentar quem tenha se sentido atingido e disse acreditar “na liberdade de expressão responsável”.

Para o promotor Jadel da Silva Júnior, as declarações do vídeo original se enquadram no crime de racismo. O despacho classifica o conteúdo como um “padrão discursivo excludente, associado à xenofobia estrutural”, que atinge de forma pejorativa migrantes de outras regiões do Brasil, especialmente do Norte e Nordeste. 

O promotor argumenta que o vídeo incita o preconceito contra não catarinenses, atribuindo-lhes a característica de “invasores” ou “indesejáveis”. A decisão se baseia em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que ampliaram o conceito de racismo para abranger a discriminação por procedência nacional. 

A decisão de enviar o caso à esfera federal se deve à “transnacionalidade” do delito. Como o vídeo foi publicado em redes sociais de acesso global, a competência para julgar o caso é da Justiça Federal, conforme entendimento consolidado do STF no Tema 393 e aplicado pelo STJ em casos semelhantes. 

Diante disso, o promotor determinou o arquivamento da Notícia de Fato no âmbito estadual e a remessa de uma cópia integral do processo à Procuradoria da República em Santa Catarina, que dará andamento à investigação.

A vereadora Ingrid Sateré Mawê se manifestou após o despacho do MPSC.

– O despacho é muito positivo, já que reconhece o crime. Seguiremos denunciando porque não somos ameaça. Nossa presença aqui é legítima. Somos força coletiva, também somos quem move, constrói e sustenta esse Estado. Violência não é opinião. Xenofobia não é liberdade de expressão – disse a parlamentar.

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