As semelhanças que nos afastam. Por Bia Vargas

Por Bia Vargas

Quando vamos criticar algo relacionado ao Brasil, sempre tem quem puxe alguma comparação com algo do exterior. Algum compositor já nomeou isso como síndrome de vira-lata. Eu particularmente, rejeito o título, acredito mesmo que podemos fazer estas comparações na intenção, ainda que ingênua, de “elevar o sarrafo”, ou de observar nas experiências de fora um bom exemplo para adaptar às realidades que encontramos aqui. Para além, no entanto, do desejo legítimo de elevar o nível de qualidade dos serviços e produtos brasileiros, é preciso conhecimento profundo das suas dores.

Florianópolis é um paraíso, e por isso os olhos lascivos percorrem suas orlas e todo espaço possível nas intenções travestidas de progresso. Devemos negar este caminho promissor e que tão bem pode nos fazer? Claro que não. Mas é sim importante ter cautela e sarar feridas abertas que podem ficar cada vez mais expostas. Estamos às vésperas de iniciar a temporada que já promete ser caótica. Quando se fala em “garantir equipamentos nas orlas”, é preciso perguntar quem tem o direito ao acesso ao determinado equipamento.

Lembro das quadras de areia construídas na Beira-Mar Norte, alguém pode defender que, em sendo público, o equipamento estaria ao alcance de todos, mas é importante reconhecermos que o acesso à cidade não está alheio às desigualdades sociais e ao racismo. Um grupo de jovens, moradores do maciço, vizinhos da avenida Beira-Mar tem a mesma possibilidade de utilizar as quadras que pessoas de mesma faixa etária oriundas de áreas mais ricas? A cidade é um organismo vivo que responde às relações de poder já estabelecidas. Ou pensamos uma cidade que subverta essa lógica, ou vamos apenas reforçar preconceitos e intensificar o processo de exclusão.

Vamos falar de equipamentos públicos fundamentais para a temporada? É importantíssimo garantir o transporte público e de qualidade para o trabalhador poder ir às praias com sua família, ou exercer sua atividade com dignidade. É imprescindível que as unidades de saúde estejam espalhadas pela ilha com funcionamento compatível. No Norte da Ilha, a UPA passa por falta de profissionais e equipamentos, no Sul há um processo para retirar a unidade do seu lugar, dificultando o acesso dos mais pobres. Não é raro, como no ano passado, que ocorra o inchaço das unidades de saúde nesta época do ano por conta da má qualidade da água. Saneamento também é equipamento público.

Nós queremos que Floripa seja uma referência internacional, mas não porque os servidores trabalham à exaustão para suprir o abandono do poder público. Queremos que nossa Capital seja referência de cidade que inclua os turistas, mas sem esquecer da população local. De maneira que nossos filhos e netos também vivam lindas histórias na Ilha da Magia e possam, talvez, ao visitar alguma cidade no exterior parecida com Floripa e poder dizer: Olha, até parece que estou em casa, aqui também tudo funciona.



Bia Vargas (PT) é empresária e concorreu a vice-governadora em 2022.

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