Marilisa Boehm (PL) é a segunda mulher a ocupar o cargo de vice-governadora de Santa Catarina e a primeira com um amplo histórico em defesa da mulher e na luta por igualdade. Na última semana, com a viagem do governador Jorginho Mello aos Emirados Árabes, ela assumiu como governadora em exercício e concedeu entrevista exclusiva à coluna.
Com 22,22% de mulheres no primeiro escalão e 43,55% nos cargos comissionados, Marilisa tem a missão de um olhar estratégico e o prioritário para as pautas em defesa da mulher.
Confira a entrevista
Dados divulgados pela Segurança Pública, em janeiro deste ano, demonstraram quedas em diversos índices, mas a violência doméstica e as mortes em confrontos subiram. Quais medidas o governo adota para combater os índices relacionados à violência doméstica, que segundo os registros subiram em 6,8%?
Na verdade, os dados da Secretaria de Estado da Segurança mostram que houve uma redução de 7,1% nos casos de violência doméstica se compararmos janeiro de 2024, quando existiram 8.733 ocorrências, com janeiro do ano anterior, quando foram registrados 9.403 casos.
A prevenção e o combate à violência contra a mulher e aos feminicídios são prioridades da Segurança Pública de Santa Catarina. Tanto que estamos ampliando a quantidade das Salas Lilás nas delegacias pelo Estado, onde as mulheres são acolhidas e têm atendimento humanizado. Eram apenas quatro em 2022, ampliamos para 20 em 2023 e a nossa programação é fechar 2024 com 65 unidades.
De que forma ter uma mulher, vinda da segurança pública, na vice-governança garante um olhar estratégico e prioritário para as causas da mulher?
Sim, com certeza. Além de ser mulher, trago comigo a experiência de três décadas atuando como delegada de Polícia, de ter criado a primeira Delegacia da Mulher em Joinville, de ter sido delegada regional e conseguido criar sete delegacias. E quem trabalha no atendimento às vítimas de violência, acaba conhecendo outros problemas que elas vivem no cotidiano. Com esse conhecimento, eu atuo permanentemente com todos os setores do governo para sugerir novas estratégias de melhoria das condições de vida das catarinenses em áreas como, por exemplo, segurança pública e no incentivo ao empreendedorismo, entre outras.
Existe uma agenda para o mês de março? Algum anúncio novo de investimentos ou ações para a pauta da mulher?
No último dia 19 reuni as mulheres que trabalham no governo Jorginho Mello, incluindo secretárias de Estado, adjuntas e outras líderes de 16 setores. Definimos que, a partir de agora, vamos criar ações permanentes voltadas às mulheres, mas de modo unificado. A ideia é tratar tudo o que já existe e tudo o que vier a ser feito sob o mesmo olhar, para aumentar os resultados. Eu assumi a coordenação deste trabalho com a meta de irmos além do mês de março, pois não podemos ficar restritos a uma data apenas.
A senhora anunciou investimentos do Governo do Estado em projetos catarinenses de pesquisa, tecnologia e inovação liderados por mulheres. Como funcionará essa parceria com a Fapesc e que outros setores contarão com apoio do governo no incentivo às mulheres?
Vamos lançar no dia 8 de março investimentos de até R$ 5 milhões por meio de duas chamadas públicas que serão feitas pela Fapesc para os programas Mulheres+Tec 3 e Mulheres+Pesquisa. As interessadas devem inscrever seus projetos. Nossa meta é ampliar a participação de mulheres neste setor, pois as catarinenses são criativas e têm competência para inovar e colaborar com a sociedade. Não tenho dúvida alguma de que vamos repetir o sucesso das primeiras edições. O investimento feito anteriormente já voltou para o estado em forma de impostos e, ainda melhor, gerando novos postos de trabalho.
O governo lançou o programa de Prevenção ao Assédio Sexual no Ambiente de Trabalho, no ano passado. Quais as ações que estão sendo desenvolvidas pelo programa?
A Controladoria Geral do Estado (CGE) e os parceiros do programa distribuíram cartilhas, cartazes e vídeos para que os órgãos e entidades façam ações de orientação aos servidores. Tudo isso está disponível no website https://www.cge.sc.gov.br/combateaoassedio/.
Para este ano estão previstas palestras e treinamentos aos ouvidores para que saibam tratar as denúncias recebidas pelo canal de Ouvidoria do Estado. Além disso, os órgãos e entidades têm pontos focais de integridade e estão fazendo ações específicas também. A Saúde, por exemplo, elaborou uma cartilha orientando a conduta ética dos servidores, incluindo questões como o assédio sexual e moral. No próximo dia 4 de março, a CGE vai lançar o Programa de Prevenção ao Assédio Moral com palestras on-line para os servidores. Da mesma forma, elaboramos cartilha, site e cartazes para os pontos focais de integridade fazerem o trabalho em seus órgãos e entidades.
Na sua trajetória pública, você já foi vítima de algum tipo de violência de gênero? Se sim, em que momento?
Na minha trajetória como delegada de Polícia eu enfrentei muitos preconceitos. Pois, na década de 1990, uma mulher ser policial era uma coisa muito difícil. Havia muita resistência, já que a profissão era considerada como algo exclusivo para homens.
Mas, graças a Deus, com o nosso trabalho na delegacia, com a equipe que trabalhou comigo, incluindo mulheres e homens, nós conseguimos a credibilidade junto à sociedade e revertemos essa situação. Entendo que era algo daquela época, uma questão cultural.
Santa Catarina tem menos de 18% de vereadoras mulheres, 28 prefeitas, em um universo de 295 cidades e 25 vice-prefeitas. Como encorajar mulheres a participar dos processos políticos?
Temos prefeitas, vice-prefeitas, vereadoras, deputadas estaduais e federais, uma senadora e uma vice-governadora. Cada vez que uma ação destas mulheres é noticiada, outras mulheres começam a entender que sim, há lugar para nós na política. Um exemplo disso foi quando disputei como candidata à vice-prefeita de Joinville, em 2016. Na eleição seguinte, a cidade viu novas mulheres em candidaturas majoritárias e, quatro anos depois, a cidade tem uma vice-prefeita.
Desde que iniciei o mandato tenho falado disso em entrevistas, eventos, nas agendas no gabinete e em palestras específicas sobre esse tema. E sempre há mulheres que me dizem que têm interesse em entrar para a política, para poder contribuir para a sociedade. Eu digo para todas que não é uma questão de competir com os homens. Nós temos capacidade de trabalhar com eles, complementando o serviço público. O fato é que não podemos jamais parar de incentivar as mulheres, que têm uma visão diferente sobre, por exemplo, questões sociais. E se cada vez mais temos mulheres brilhando em áreas técnicas, tecnológicas, nas indústrias, nos negócios, na ciência, no esporte, na cultura e em todas os setores do conhecimento humano, por qual razão as mulheres não poderiam estar na política?
Foto – Ricardo Wolffenbuttel, Secom-SC.