Vinicius Lummertz escreve sobre Santa Catarina poder se tornar “sócia” de uma companhia aérea para fortalecer os voos regionais. Entenda como essa proposta pode transformar a conectividade e a economia do Estado.

O governador Jorginho Mello lançou uma ideia inovadora ao propor ser nosso Estado “sócio” de uma companhia aérea para a promoção de voos regionais em Santa Catarina. Sociedade lato sensu e não stricto sensu, como bem destacou Upiara Boschi neste espaço.
Essa iniciativa surge em um momento crítico, pois o Estado foi pego no contrapé com a interrupção dos voos que atendiam ao Planalto Serrano pelo aeroporto de Correia Pinto e ao Sul do Estado por Jaguaruna. Além disso, há ameaças às operações possíveis em Caçador, Joaçaba e até mesmo Chapecó.
A decisão do Governo de Santa Catarina é acertada e segue exemplos bem-sucedidos em outros países. Seu objetivo não é apenas manter a conectividade dentro do Estado, mas também criar uma base para superar desafios de infraestrutura e impulsionar as economias regionais.
Um caso semelhante ocorreu na parceria entre a Gol e a ilha de Barbados, no Caribe, como em muitos outros casos. Assim já funciona no Pará, nos seus destinos longínquos. Em Barbados, o governo financiou, por anos, um conjunto de assentos na companhia aérea, como um seguro, para incentivar o turismo de brasileiros para a ilha. Também investiu em promoção dos voos. Isso ajudou a consolidar Barbados como destino turístico e impulsionou a promoção do país. O objetivo foi atingido.
Santa Catarina pode seguir essa lógica, pois a aviação significa mais do que transporte: ela gera eficiência, impulsiona negócios e movimenta economias. Um voo de apenas uma hora pode substituir mais de sete horas em rodovias precárias – como é o caso das estradas federais que cortam o Estado. São os aviões que transportam também as cargas de maior valor agregado de um país.
Conectividade e Competitividade do Brasil
O Brasil, com sua vasta extensão territorial e mais de 2.500 aeroportos, possui a quarta maior aviação civil do mundo, mas ainda não desenvolveu seu potencial na aviação regional. A falta de um Plano Nacional de Conectividade Aérea tem prejudicado a utilização plena dessa infraestrutura.
A maioria dos aeroportos regionais no Brasil não é operacional ou não oferece voos regulares, o que limita a integração nacional e a competitividade das regiões mais afastadas. Além disso, esses aeroportos não funcionam como alimentadores da malha aérea dos grandes hubs nacionais, o que acaba prejudicando as próprias cias aéreas.
O modelo atual das companhias aéreas brasileiras – com a Gol integrada à Boeing, a Latam à Airbus e a Azul à Embraer – limita o desenvolvimento da aviação regional. Diferentemente dos Estados Unidos, onde há um ecossistema de pequenas aeronaves, o Brasil ainda carece de uma estratégia integrada para a conectividade aérea.
Isso impacta diretamente a produtividade do país. Nos últimos 30 anos, a produtividade do Brasil cresceu cerca de 30%, enquanto a da China avançou 890%. No centro dessa diferença está o compromisso chinês com a logística – o que justifica investimentos massivos, como a Nova Rota da Seda. Hoje, a China recebe mais de 150 milhões de visitantes por ano.
Carga Tributária e o Impacto no Setor Aéreo
Um dos maiores obstáculos para o setor aéreo no Brasil é a carga tributária excessiva. O país está entre os mais taxados do mundo na aviação, com impostos que podem chegar a 39%. Para comparação, nos Estados Unidos a carga tributária média é de 7,5%, e na União Europeia, 16%.
Além disso, o custo do querosene de aviação (QAV), que representa uma parte significativa das despesas operacionais das companhias aéreas, é mais de 10% superior à média global. A tributação da malha aérea é uma prioridade equivocada. Trata-se de uma indústria meio e indutora.
O ideal seria que um Plano Nacional de Conectividade Aérea promovesse eficiência no transporte e adotasse uma visão integrada e de longo prazo: uma menor taxação sobre os transportes aumenta a capacidade de arrecadação tributária ao longo da cadeia produtiva, melhora a produtividade econômica e eleva a qualidade de vida dos viajantes.
Enquanto um plano nacional não é implementado, os Estados buscam soluções próprias. Em São Paulo, no governo João Doria, por exemplo, o governo reduziu o ICMS sobre o QAV de 25% para 12%, exigiu investimentos das companhias aéreas em publicidade e garantiu um aumento de 700 voos semanais, além da conexão de 12 aeroportos regionais. Também privatizou 20 aeroportos estaduais. Resultado: a arrecadação de ICMS subiu. Pergunte ao Meirelles. O governador Tarcísio manteve.
A decisão de Santa Catarina é correta e economicamente viável. Além de fortalecer a malha aérea dentro do Estado, é fundamental conectar Curitiba e Porto Alegre. Enquanto não há uma estratégia nacional, devemos fazer o que Santa Catarina sempre fez bem: dar o exemplo.
Santa Catarina já está conectada com a Europa via TAP e com os EUA via Copa Airlines, e logo mais por companhias norte-americanas. Chile, Argentina e Uruguai já estão ligados. Ao nos integrarmos ao mundo, mais razões temos ainda para nos integrarmos internamente e com o Sul do país. Está certo, portanto, o governador de Santa Catarina.
Vinicius Lummertz (MDB) foi ministro do Turismo.