As eleições americanas têm movimentado a internet, e estou acompanhando de perto através de diferentes vozes influentes, como a vencedora do Oscar Anne Hathaway e o escritor Nassim Taleb, de quem gosto muito. Se tem algo que este ciclo eleitoral está mostrando, é que, no campo digital, “responder aos fatos” não é mais suficiente — é preciso criar os fatos, ou pelo menos a forma como eles repercutem. A campanha de Kamala Harris, que opera com uma estratégia digital de ponta, exemplifica o que há de mais moderno em termos de comunicação política nas redes. E se você pensa que o engajamento online é algo trivial, pare um momento e reflita sobre o impacto disso nas urnas. Depois de analisar profundamente as eleições nos EUA, está claro que o digital não é mais um complemento — ele é o eixo central de qualquer campanha relevante.
Veja esse perfil do HQ de Kamala no TIKTOK: https://www.tiktok.com/@kamalahq
Um exemplo brilhante é a equipe de Harris. Apesar de contar com um grande time, eles gerenciam conteúdo de forma ágil, dominando o ambiente online em tempo real. A filosofia deles? “Confiar no time, eliminar a burocracia e postar em cinco minutos.” Essa agilidade é crucial. Quando Trump chamou os imigrantes de uma “ameaça”, a equipe de Harris não apenas respondeu — eles postaram um clipe em minutos, viralizando o momento e moldando a percepção pública instantaneamente. A velocidade e a precisão são armas poderosas, e Harris e sua equipe dominam esse campo, assim como vimos, em menor escala, com Pablo Marçal em São Paulo.
A regra é ocupar os espaços
Mas a estratégia vai além da velocidade. Cada membro da equipe digital de Harris é especializado em uma rede social específica. Em um contexto onde o TikTok se consolidou como um dos aplicativos mais populares nos EUA, com 170 milhões de contas ativas e 40% dos usuários utilizando-o para se informar sobre política, a presença na plataforma não é apenas estratégica — é essencial. A campanha adotou um estilo que, à primeira vista, pode parecer amador ou tosco, mas esconde uma estrutura meticulosamente planejada. O uso de memes, vídeos “cortados” e momentos leves faz parte de uma tática calculada para penetrar em espaços não-políticos e alcançar eleitores indecisos ou desinteressados.
Harris e sua equipe não estão apenas postando vídeos divertidos — eles estão criando uma narrativa digital. Pegam as falas mais absurdas de Trump e as recontextualizam, transformando-o no vilão de uma história maior. Um exemplo disso foi quando, em vez de amplificar o discurso de Trump, adicionaram efeitos de “galinha” às suas falas em um debate, tornando sua tentativa de seriedade em um motivo de chacota. Esse equilíbrio entre humor e ataque político está definindo a estratégia digital moderna, em ambas as campanhas.
O fator humano e o impacto no eleitorado jovem
A maior inovação trazida pela campanha de Harris foi dar espaço para uma nova geração, os Gen Z, que cresceram imersos nas redes sociais. Esses jovens estrategistas entendem intuitivamente como cada meme ou som viral se espalha e sabem quando um conteúdo perde a sua relevância. Um exemplo: a equipe evita usar sons no TikTok que já foram utilizados em mais de 200 mil vídeos, pois “as pessoas se entediam facilmente”. Isso vai além do instinto — é uma análise precisa do comportamento digital.
E os resultados falam por si. Durante a “era Harris”, o engajamento online da campanha disparou. No TikTok, a taxa de “like-to-view” — uma métrica crucial de engajamento — subiu de 10% para 25%. A tática de parecer original e não planejado, somada à capacidade de ressoar emocionalmente com o eleitorado jovem, está gerando um impacto real. A autenticidade é a moeda mais valiosa no ambiente digital, e Harris e sua equipe têm maximizado isso ao extremo.
O poder do digital
A grande questão que fica é se esse esforço digital massivo vai se traduzir em votos. Em 2020, vimos como as redes foram fundamentais na eleição de Joe Biden, mas as estratégias evoluídas de 2024 mostram que chegamos a um novo patamar no uso do digital. E não são apenas os democratas que estão jogando esse jogo — a campanha de Trump também conta com um time de TikTokers e está disputando o mesmo espaço.
No entanto, a campanha de Harris, ao unir inovação, agilidade e humor, mostra que o digital é moldado para tempos de atenção cada vez mais curtos. É uma dança constante entre o viral e o substancial, e encontrar esse equilíbrio pode ser o fator decisivo entre ganhar ou perder uma eleição.
O teste final? Em novembro, quando veremos se esse domínio digital será suficiente para transformar engajamento em poder político real. Uma coisa é certa: quem souber criar as melhores narrativas — e criá-las rápido — estará à frente no jogo.