Cultura como acesso ao direito à cidade. Por Elaine Sallas

Elaine Sallas escreve artigo em que critica a falta de investimentos na cultura em Florianópolis e defende a criação de uma Secretaria de Cultura autônoma, com políticas públicas mais inclusivas e participação da sociedade.

Florianópolis vive os efeitos de um governo que investe pesado em propaganda, mas não qualifica os serviços públicos. Basta circular pelos bairros da Ilha e do Continente para perceber a ausência de cuidado e gerência com as questões mais básicas: infraestrutura, saúde, educação e segurança pública.

Na cultura não é diferente: há uma paralisia crônica em termos de investimento. Com quinze setoriais ligadas à área (teatro, dança, música, circo, artes visuais, audiovisual, hip hop, arte-educação, contação de histórias, cultura digital, cultura negra, cultura popular, humanidades, patrimônio e produção cultural), menos de 0,5% da arrecadação é destinado ao Fundo Municipal de Cultura.

Investir nessa área, além de trazer retorno econômico para o município, com geração de emprego e renda, produz o sentimento de identidade e pertencimento da população, impactando positivamente outras pastas. Mas, para que isso efetivamente aconteça, precisamos ampliar o diálogo, investir com seriedade em estrutura e recursos humanos.

A falta de atenção pública adequada à área ficou escancarada nos últimos meses, com o avanço da Operação Presságio revelando como agiam o ex-secretário e os demais envolvidos da Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e Esporte, que utilizaram a cultura e a política de eventos para o enriquecimento ilícito e demais improbidades administrativas. Enquanto isso, os trabalhadores e trabalhadoras da área não tiveram posicionamento algum sobre o Fundo de Cultura ou sobre as  políticas que estruturem e descentralizem a vasta produção artística local. 

Diante deste, e de tantos outros fatos, é inevitável afirmar que a gestão atual não representa quem vive e produz arte na cidade. A transformação da Cultura em uma secretaria única e autônoma, sem vínculos com as pastas de turismo e esporte, será o ponto de partida para a implementação concreta das políticas públicas da área, para garantir a efetividade do Conselho Municipal de Cultura e a construção conjunta e participativa entre a sociedade civil e a Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes, seguindo um caminho estratégico para o cumprimento do Plano Municipal de Cultura com responsabilidade e transparência sobre o Fundo Municipal.

Proteger os patrimônios culturais e históricos, celebrar a cultura e a história negra são fundamentais para a manutenção da identidade e preservação da memória. A proteção dos pescadores artesanais e seus ranchos, das rendeiras, dos terreiros de religiões de matrizes africanas, dos saberes e fazeres dos povos de axé, das batalhas de rap, e de tantas outras manifestações culturais, que nos colocam na melhor cena cultural da América Latina, precisa ser prioridade.

Diante de tantas dificuldades, nossa luta nunca arrefeceu, mesmo nos períodos mais turbulentos, como na pandemia; quando os nossos trabalhadores e trabalhadoras ficaram completamente à deriva, aprofundamos o entendimento de cidade, através de estudos e da escuta atenta das pessoas em diversos espaços. Por isso é urgente termos uma construção política aberta, com mecanismos para as pessoas pensarem, opinarem e participarem desse processo ativamente. Nosso projeto para o legislativo vem da necessidade de ocupar os espaços que nos são negados, por meio de políticas públicas amplas, democráticas, acessíveis e permanentes. Esse é o nosso direito.


Elaine Sallas é produtora cultural, professora da rede pública e candidata a vereadora de Florianópolis pelo PSOL.

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