Da Spaten a Eduardo Paes: quando o espetáculo sai Fora do Tom

Essa todo mundo ficou sabendo.

A briga generalizada entre Popó e Wanderlei Silva no badalado Spaten Fight Night escancarou um erro clássico de comunicação: apostar em visibilidade sem ter o controle do enredo. A marca queria o brilho do espetáculo e acabou virando o rosto da confusão. Na política, podemos fazer um paralelo direto utilizando o prefeito Eduardo Paes e o Carnaval do Rio. Quando o show dá errado, o patrocinador vira personagem do próprio caos.

Quando tratamos de gestão de crise e reputação, controle é uma palavra crucial. Devemos evitar algo que não possamos dominar, integral ou parcialmente.

A cervejaria Spaten cometeu um erro (mas seria mesmo um erro?) que podemos trazer para as áreas política e pública. O suposto erro não foi ter patrocinado o espetáculo, mas a aposta de que o show teria “a cara dela”. E esse é o ponto em que marketing e política se cruzam: quem não controla a cena não pode querer ser o rosto dela.

A Spaten queria um espetáculo pra chamar de seu e não poupou mídia. O Spaten Fight Night, em São Paulo, era para ser a consagração de uma estratégia ousada de marketing: associar a marca de cerveja a um evento de adrenalina e rivalidade. Popó e Wanderlei estavam no ringue, mas importava também aqueles que viam a luta da plateia, como celebridades e influenciadores. Além, é claro, dos milhões de espectadores que acompanhavam de suas casas e na internet.

Tudo parecia perfeito até o momento em que o roteiro saiu do controle. A luta virou briga, a desclassificação virou confusão, e o evento que seria símbolo de força e energia acabou se transformando em manchete de violência e descontrole.

A Spaten não foi coadjuvante desta crise, e sim a grande protagonista. Este caso é um verdadeiro manual sobre o risco de associar uma marca (ou o nome de um político) a algo que não se controla. Quando a cervejaria se colocou como “dona da festa”, assumiu, ainda que não tenha previsto todas as consequências, a responsabilidade simbólica pelo que acontecesse no ringue.

A reação da empresa foi uma nota fria e demasiadamente institucional. Na era da emoção, respostas burocráticas não ajudam a curar as feridas. Pesquisas sobre gestão de crise mostram que, em episódios de forte repercussão emocional, o público responde mais positivamente à voz humana, obviamente mais empática e sincera, do que à linguagem técnica.

Este episódio vai muito além do boxe e escancara um fenômeno cada vez mais comum na comunicação política atual: a visibilidade sem direção e controle. Marcas e políticos correm atrás de exposição, mas esquecem que, sem controle, o brilho pode se transformar em incêndio.

Portanto, é pedagógico usar Eduardo Paes como um paralelo deste episódio na política. A prefeitura é, há anos, a patrocinadora e organizadora do Carnaval. Enquanto tudo corre bem na maior festa popular do país, Paes é o rosto da alegria e do Rio que dá certo.

Mas basta algo sair do script, seja uma ocorrência de violência ou uma falha de segurança, para que o evento se transforme em manchetes negativas. Mesmo que Paes não tenha responsabilidade direta sobre os blocos ou foliões, o público o enxerga como o “dono do espetáculo”.

Essa lógica tem nome em diversas teorias da comunicação: responsabilidade simbólica. Não importa o quanto alguém tenha, de fato, responsabilidade operacional por algo. O público sempre vai associar a ele ou a ela o fracasso daquilo que carrega seu selo.

Além da crise em si, como profissional de comunicação estratégica, preciso analisar uma dimensão ética que envolve o episódio. A Spaten, ao patrocinar um combate, entrou no pantanoso território da agressividade e da rivalidade. Isso cria uma espécie de dissonância de valores entre o que a marca quer representar, como a sociabilidade e a leveza, e o evento violento que entregou. Essa incongruência é fatal para a reputação, porque o público percebe incoerência.

No caso de Paes, a equação é semelhante, pois ele é o prefeito da cidade que mais encarna a alegria brasileira, mas também a que mais sofre com os riscos e contradições da própria festa. O Carnaval é o ativo de imagem mais forte do Rio, mas também seu terreno mais instável. Em cada incidente, o prefeito é cobrado como se fosse o coreógrafo do caos.

O que une Spaten e Paes é o binômio patrocínio e controle. Quando o patrocínio é alto e a emoção intensa, o controle é baixo e o risco é altíssimo.

As regras de gestão de crise são claríssimas nesse ponto: se a reputação é um ativo intangível, a governança precisa ser clara. Isso significa, por exemplo, cláusulas em contratos, planos de contingência pré-definidos e mapeamento de risco. Nenhum desses parece ter sido prioridade para a Spaten. E o Paes (e, consequentemente, a Prefeitura) têm protocolos de gestão e prevenção de crises?

Porque, quando a crise chega, meus amigos, a resposta é tão importante quanto o erro. Uma nota fria pode ser tecnicamente correta, mas emocionalmente inútil. Na era da desintermediação, em que todos falam direto com o público, o silêncio ou o juridiquês são interpretações de fraqueza. As marcas e os políticos que sobrevivem às crises são os que falam rápido, com voz humana e senso de pertencimento. É melhor dizer “estamos decepcionados e vamos aprender” do que esconder-se atrás de comunicados de assessoria.

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