Por Soledad Urrutia, a jornalista do penúltimo parágrafo
Todos os anos leio matérias e aplaudo discursos falando de como evoluímos na representação da mulher após o voto feminino, que hoje comemora exatos 92 anos. Com 40 anos eu vivi as maiores transformações da história. Do fax à Inteligência Artificial, capaz de criar filmes de animação com meu rosto em minutos. Desculpem. Estamos em 2024 e ainda somos menos de 25% nos cargos de primeiro escalão no Governo do Estado, que defende e apoia a representatividade feminina. Somos menos de 8% no parlamento estadual, 17,6% nas Câmaras de vereadores e menos de 10% dos líderes do executivo municipal. Temos uma senadora que entrou por ser suplente e que foi suplente porque era esposa de Luiz Henrique da Silveira. Na Câmara dos deputados comemoramos 5 das 16 vagas.
Em toda data ligada à mulher, seguimos olhando para o passado e comemorando a primeira mulher negra a conquistar uma vaga de deputada estadual no Brasil, Antonieta de Barros. E aplaudimos quando nos deparamos que 86 anos depois tivemos novamente uma mulher como primeira secretária na mesa diretora da Assembleia Legislativa. Não temos futuro para comemorar.
Os números melhoraram, podem dizer os otimistas. Mas quando nos deparamos com a violência de gênero explícita na política e em todos os ambientes de poder, eu afirmo: somos lentidão. Quando recebo a notícia de que em 2023 tivemos 8.733 casos de violência doméstica registrados pela nossa Segurança Pública, eu afirmo: fracassamos. Mais de 50 mulheres morreram em 2023 vítimas de feminicídio.
Estamos discutindo políticas de representatividade, leis para assegurar o bem-estar das mulheres, o aborto e as oportunidades da mulher, num universo maioritariamente de homens. Se o direito ao voto, em 1932, nos abriu oportunidades, ele também nos confrontou com um espaço no qual as decisões desde sempre foram ditadas por homens.
Se em 2024 uma jornalista que escreve sobre liderança feminina ainda tem receio de defender os direitos de seus filhos à pensão de alimentos, por medo da repressão que enfrentará, é porque, me desculpem os otimistas, ainda temos um longo caminho a percorrer.
Não é só o voto da mulher que vai mudar a política. É a sociedade que precisa mudar e abrir voto à igualdade e ao respeito.
Ilustração: Galvão Bertazzi.