Eleições no Chile: voto obrigatório, tecnologia analógica e um país dividido. Por Filipe Schmitz

Artigo de Filipe Schmitz, advogado e ex-vice-prefeito (MDB) de Antônio Carlos/SC

O Chile vive neste domingo, o 2º turno de uma de suas eleições mais emblemáticas dos últimos anos, combinando elementos de modernização democrática com características ainda bastante tradicionais. A implantação do voto obrigatório, sem limite máximo de idade e com multas significativamente mais altas que as brasileiras, mudou o comportamento do eleitorado, elevando a participação e reacendendo discussões sobre cidadania, liberdade e dever público.

A multa aplicada a quem deixa de votar, que varia de aproximadamente 35 a 105 dólares, impõe um custo real à abstenção e tem sido interpretada como um dos fatores de adesão massiva às urnas. A diferença é ainda mais marcante quando se observa que, em 2013, a abstenção eleitoral chilena chegou a 59% — um dos índices mais altos da história recente do país. O cenário atual, em contraste, demonstra um eleitor mais compelido a participar, ainda que motivado, em parte, pelo temor do peso financeiro da penalidade.

Mesmo com cerca de 15 milhões de eleitores, o país mantém um sistema analógico de votação, baseado em cédulas de papel e apuração manual. Trata-se de um contraste com o Brasil, que adota urnas eletrônicas desde 1996, algo que no Chile levanta debates sobre eficiência, transparência e até mesmo confiança no processo eleitoral. Outro elemento singular é a proibição da divulgação de pesquisas eleitorais nos 15 dias que antecedem a eleição, medida que, sob certa perspectiva, favorece uma escolha menos guiada por tendências momentâneas e mais por identificação ideológica, contrastando, mais uma vez, com a democracia brasileira.

No campo político, o resultado da “primeira vuelta”, 1º turno das eleições, confirmou o ambiente polarizado que marcou toda a campanha. A comunista Jeannette Jara, com 26,8% dos votos, e o conservador José Antonio Kast, com 23,9%, com o favoritismo indicando desta vez o direitista José Kast, que disputa pela terceira vez a presidência do país. A segurança pública e a imigração dominaram o debate eleitoral, mesmo em um dos países mais seguros da América do Sul. A sensação de insegurança, no entanto, cresceu, tornando-se combustível para narrativas que capturaram o sentimento popular e reorganizaram as prioridades do eleitorado.

Esse conjunto de fatores — voto obrigatório com multa elevada, sistema analógico, restrição à divulgação de pesquisas e uma agenda pública tomada por temas sensíveis, compõe um retrato complexo do Chile contemporâneo.

Uma democracia que busca estabilidade, enfrenta medos coletivos e tenta equilibrar tradição e modernização em meio a uma disputa política tão acirrada quanto simbólica.

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