Entre as urnas e os tribunais

A defesa sistemática que faz o senador Esperidião Amin (PP) dos condenados nos atos golpistas que culminaram na prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de assessores próximos e dos invasores dos prédios dos Três Poderes, tem sido tema recorrente nas conversas da política catarinense. 

Foto: JlCibils / 2002

Mesmo tendo votado pela redução das penas —foi relator do projeto no Senado—, ele não esconde que é a favor da anistia ampla e irrestrita a todos os condenados.

Aqui mesmo no portal, o assunto já rendeu dois artigos. Fred Perillo sustentou que Amin promoveu uma guinada à extrema direita para surfar na onda do bolsonarismo. Marcelo Natalle, por sua vez, argumentou que o senador sempre esteve nesse campo, apenas passou a se comunicar de forma mais explícita.

Quem acompanha a política catarinense —no mínimo nos últimos 20 anos — sabe que Amin não é muito simpático a aceitar o resultado das urnas quando perde. 

Com exceção de 2002, quando perdeu para Luiz Henrique (MDB) —por pouco mais de 20 mil votos— e assimilou a derrota, na eleição de 1994 para presidente (6º lugar, com 2,75% dos votos) e a derrota acachapante de 2022 para governador ( 5º lugar com 9,75% dos votos), nas outras duas vezes que disputou cargo majoritário, e perdeu, ele levou a eleição para os tribunais. 

Em 2002, segundo a Folha de São Paulo, do dia 28 de outubro, Amin disse ser “impossível que uma trajetória democrática colecione somente a vitória”. Ainda de acordo com o jornal, pediu palmas para seus correligionários e disse compartilhar “a tristeza, até pela diferença caprichosa dos votos”. Está lá nos arquivos da Folha, que ele cumprimentou Luiz Henrique e o parabenizou pela “vitória democrática”. 

Que fique claro, que é um direito de quem perde, e entende que a eleição foi irregular, recorrer à justiça. 

Terceiro turno

Já em 2006, quando tentou voltar ao Governo e enfrentou Luiz Henrique novamente, o resultado não foi bem recebido. Mesmo tendo perdido o segundo turno por mais de 170 mil votos, Amin foi ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE) acusando o vencedor de abuso do poder político, econômico e dos meios de comunicação.

As principais acusações eram de que o Governo fez anúncios e, por isso ganhou a simpatia, de mais de 140 jornais do interior do Estado e também porque LHS prometeu isentar de IPVA as motocicletas. Medida que teria beneficiado cerca de 370 mil eleitores. 

O TRE julgou o recurso improcedente, então Amin foi ao TSE e estava quase levando a questão. Na primeira sessão de julgamento, em fevereiro de 2008, com o voto pela cassação do ministro relator José Delgado, sendo acompanhados pelos ministros Ari Pargendler e Gerardo Grossi, faltava apenas um voto para defenestrar LHS do poder. Já tinha gente confeccionando o terno para voltar ao Governo.

Foi quando então entrou em cena uma nova questão. Leonel Pavan, o vice-governador não havia cito citado no processo e isso rendeu um pedido de vista do ministro Marcelo Ribeiro. E a partir daí o jogo mudou e Amin acabou perdendo o recurso, que Luiz Henrique chamava de “terceiro turno”.

Em maio de 2009 o processo voltou ao pleno do TSE, já com outra composição. O relator então foi o ministro Félix Fischer, que votou pela improcedência do recurso, justificando que as provas apresentadas eram insuficientes para definir o resultado da eleição. Ele foi seguido pelos ministros Fernando Gonçalves, Marcelo Ribeiro, Arnaldo Versiani e Ricardo Lewandowski. Somente o presidente do TSE, Aires de Brito, divergiu pela cassação.

O mais curioso é que Luiz Henrique esteve na eminência de ser cassado, mesmo sendo o único governador, até agora, que renunciou ao Governo para disputar a reeleição, alegando “igualdade de condições com o adversário”.

Para registrar, neste mesmo ano o TSE cassou os governadores Cassio Cunha Lima, da Paraíba, e Jackson Lago, do Maranhão, ambos por abuso do poder econômico e político nas eleições.

Prefeito itinerante

Derrotado para o Governo do Estado em 2006, Esperidião Amin retornou às urnas dois anos depois, em 2008, tentando voltar à Prefeitura de Florianópolis, onde fora prefeito biônico de 1975 a 1978 e eleito em 1988 (renunciando em 1990 para concorrer ao Senado). Perdeu para Dario Berger (57,7% a 42,3%) que disputou a reeleição. 

Novamente, Amin levou a eleição para os tribunais, não aceitando a derrota. A alegação era de que Dario Berger era “prefeito itinerante”. Havia tido dois mandatos em São José, renunciado no segundo e mudado para a capital, sendo eleito em 2004 e reeleito em 2008.

Os advogados de Amin se baseavam no artigo 14 da Constituição Federal, que permite apenas uma reeleição para prefeito. No TRE o recurso não prosperou, mas em Brasília, a situação foi tensa. 

A decisão, contra a cassação, foi por quatro votos a três. A defesa de Dario baseava-se em uma consulta feita ao TRE, antes mesmo de renunciar o mandato em São José, no ano de 2004. A corte catarinense interpretou a Constituição de forma que a proibição de mais de uma reeleição não especifica se o candidato trocar de município.

Na sessão plenária do TSE, a ministra Carmem Lúcia, relatora do recurso, votou contra a cassação afirmando que Dario não tentou burlar a legislação e sim consultou oficialmente a justiça catarinense, antes da mudança. 

Ela foi seguida pelos ministros Marco Aurélio de Mello e Gilson Dipp. Se posicionaram de forma contrária, André Versiani, Nancy Andrigi e Marcelo Ribeiro. Coube ao ministro Lewandowski, hoje ministro da Justiça do Lula, o desempate a favor de Dario Berger. 

Diferente do resultado obtido por Dario Berger, oito prefeitos brasileiros foram cassados por mudança de domicílio nesta mesma época. Hoje está pacificado, tanto no TSE quanto no STF, que não existe mais prefeito itinerante. Dario Berger foi o último e só conseguiu concluir o mandato porque fez uma consulta prévia ao TRE.

Dois gabinetes

Como a ação contra Luiz Henrique foi julgada apenas em 2009 e Amin perdeu a eleição de prefeito em 2008, entrando com a ação contra a eleição de Dario Berger logo após pleito, em determinando momento —de janeiro a maio de 2009— ele pleiteava na justiça, simultaneamente, o Governo do Estado e a Prefeitura de Florianópolis.

Seus críticos ironizavam, afirmando que caso tivesse vencido as duas ações —o que não ocorreu — teria que despachar pela manhã em um gabinete e a tarde em outro. 

O processo de cassação de Dario Berger só foi julgado em outubro de 2011, pouco mais de um ano antes de acabar seu segundo mandato.

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