
A nova estratégia de comunicação do governo Lula está no tom certo ou fora da curva?
O governo federal (com a esquerda e o PT à reboque) finalmente deu um passo que há muito tempo era cobrado por aliados e, ironicamente, até mesmo pelos adversários: reagir no campo da comunicação.
Depois de meses apanhando em silêncio, o governo resolveu contra-atacar. E fez isso apostando no enredo mais potente que ainda tem disponível neste inferno astral que atravessa: a luta de classes. O velho embate entre ricos e pobres, que sempre foi um motor simbólico e eleitoral.
A nova campanha, apelidada de BBB – sigla para bilionários, bancos e bets (casas de apostas) – traz um discurso simples e com potencial de se tornar popular: o governo quer taxar os super-ricos e aliviar a vida dos mais pobres.
Uma pauta legítima, urgente e necessária. Em um país onde os que ganham mais pagam, proporcionalmente, menos impostos, a ideia central faz todo o sentido. E isso nem deveria ser alvo de disputa ideológica.
Mas, voltemos à comunicação, porque senão quem apanhará sou eu.
Além desse mote, a estratégia de pulverizar a mensagem com influenciadores e microinfluenciadores é correta.
O PT, que sempre se orgulhou da comunicação de massa, percebeu, ainda que tardiamente, que a massa agora se organiza em rede. Não basta fazer pronunciamento em cadeia nacional, como o partido sempre apreciou.
É preciso capilaridade, presença nas conversas cotidianas e postagens no feed de quem você confia. Isso está absolutamente alinhado com o mundo contemporâneo: as pessoas confiam mais em pessoas do que em instituições.
O problema é que o governo acerta no tema, mas erra na forma.
Os vídeos que estão circulando nas redes sociais usam Inteligência Artificial para criar personagens e cenários. Ok, é moderno, chamativo, a esquerda tem razão em surfar no assunto do momento. E, de fato, os vídeos em IA chamaram a atenção pelo formato incomum. Viralizaram, geraram repercussão e viraram pauta na imprensa.
Mas teve um péssimo efeito colateral: chamaram tanto a atenção que irritaram ainda mais o Congresso. Os vídeos, que deveriam mobilizar a opinião pública, acabaram servindo também como inflamador da crise política e ampliaram o desgaste entre o Planalto e o parlamento.
Além do problema político, do ponto de vista da narrativa comunicacional os vídeos em IA soaram gélidos e impessoais.
Em uma campanha que pede calor humano, que tenta traduzir a vida real, usar IA para simular gente parece um contrassenso.
Não é uma crítica ao uso da tecnologia em si. IA pode (e deve) ser usada para agilizar processos, gerar dados e personalizar mensagens. E até escrever artigos, o que, evidentemente, não é o caso deste aqui (rs).
Mas quando a pauta é tão emocional, como o custo de vida e a injustiça tributária, o que conecta são pessoas reais. Histórias verdadeiras. Rostos, olhares, a emoção em estado bruto. A narrativa folhetinesca precisa de carne e osso, não de pixels.
O problema de fundo da campanha BBB não é técnico. É estratégico e político. O governo parece estar falando para dentro, para os já convertidos. Politicamente, bater no Congresso pode agradar as redes da esquerda, mas isola o governo no campo da governabilidade. É uma batalha mal escolhida.
É evidente que o Congresso tem suas distorções, que muitas pautas beneficiam os mais ricos e que as casas legislativas não são exatamente um templo da justiça social.
Mas a regra é clara: o governo depende do Congresso. O voto para taxar bilionários não vai cair do céu. Ou seja, essa disputa precisa ser conduzida com inteligência política, não apenas com coragem discursiva.
O governo tenta acertar na comunicação, mas segue patinando na política e na gestão. O tripé clássico (comunicação, política e gestão) precisa caminhar junto. Quando uma falha, as outras não compensam. Quando duas falham, o castelo desmorona.
Lula tenta ajustar a comunicação, ainda que tardiamente, mas continua fabricando crises internas, tropeçando em disputas dentro da própria base e tratando o Congresso como um adversário fixo, quando deveria ser, no mínimo, um parceiro circunstancial.
O resultado é um governo que se movimenta, mas não avança. É como o caranguejo, um crustáceo símbolo de alguns estados nordestinos, região onde Lula tem perdido apoio: dá um passo pra frente, dois pra trás.
A campanha BBB pode melhorar o engajamento, agitar as redes e alimentar o enredo do bem contra o mal. Mas dificilmente será suficiente para recuperar a popularidade perdida.
A justiça tributária é um bom enredo, mas narrativa sem entrega não emociona. E, sem articulação, não vira lei. Fica só no discurso.
Em um mundo onde a confiança está em baixa, a política é vista com desconfiança e as pessoas querem sentir que a vida está melhorando, o governo precisa entregar mais do que vídeos modernos. Precisa entregar impacto real.
E, sinceramente: IA pode até chamar atenção, mas voto se ganha com gente.
Ps: como já é praxe na coluna, a imagem foi gerada por IA.