O dia 27 de julho de 2001 ficou marcado na história da Assembleia Legislativa de Santa Catarina por um intenso debate em torno de um projeto que autorizava o Governo de Santa Catarina, governado à época por Esperidião Amin, a contratar um empréstimo de U$ 150 milhões no Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID) para investir em rodovias. O Programa BID IV.

A oposição, liderada por PMDB, PT, PDT e PPS trabalhava para que o projeto não fosse votado em regime de urgência. Quando o requerimento foi colocado em votação, para que se aprovasse ou não a urgência, as bancadas decidiram deixar o plenário, evitando o quórum. Entretanto, o deputado Romildo Titon, do PMDB, ficou e garantiu o quórum, criando um bafafá até mesmo dentro do partido.
A desculpa para que o projeto não fosse votado em regime de urgência, alegado por diversos deputados, como João Henrique Blasi (líder do PMDB) Jaime Duarte (líder do PPS) e Afrânio Boppré (líder do PT), era de que não havia a definição das rodovias que seriam beneficiadas com o financiamento. Já, o entendimento da situação era de que a oposição queria apenas retardar por mais 60 dias a votação e dificultar o Governo de ter um canteiro de obras em 2002, quando Amin disputaria a reeleição.
O mais curioso dessa história é que Luiz Henrique da Silveira, na época prefeito de Joinville, chegou a ir à Alesc trabalhar contra a aprovação da urgência no projeto. Com o quórum garantido por Titon, o projeto foi colocado em regime de urgência e aprovado em seguida, sem sessão extraordinária, com o voto de todos os deputados. No ano seguinte, Luiz Henrique foi eleito governador, assumindo em 2003, e Amin não havia executado nem 30% das obras do Programa BID IV, cabendo a ele aplicar o restante do dinheiro nos oito anos que permaneceu no Governo.
E ainda mais: houve nesse período uma valorização do dólar frente ao real, que fez o financiamento aumentar, com a inclusão de mais rodovias e garantir o sucesso de suas administrações.
Lendo a ata daquela sessão é possível ver como os ânimos estavam exaltados.
Assim que garantiu o quórum, o deputado Romildo Titon foi à tribuna e fez um discurso em sua defesa.
– Então, eu não vejo por que eu tenho que me retirar daqui. Eu tenho uma posição firme, gosto de atuar no Parlamento de acordo com os meus princípios, com as minhas ideias, mas principalmente e acima de tudo defendendo a minha região. Não é por questões políticas, que tenho que obedecer a minha Bancada. Eu tenho uma posição, e uma posição independente, por isso vou ficar presente do plenário – disse Titon, enquanto seus colegas de bancada se retiravam.
O deputado João Henrique Blasi, hoje desembargador do TJSC, defendeu o posicionamento da oposição:
– E eu quero reiterar aqui que nossa posição é no sentido de ser favorável ao projeto porque é benfazejo para o Estado de Santa Catarina. Todavia, divergimos da forma como foi trazido, pela rapidez que se lhe quer imprimir, e, repito, na tentativa de impor goela abaixo a aprovação de um projeto sem que seja feito o aprimoramento através das emendas que são um apanágio e uma prerrogativa de cada Parlamentar com assento nesta Casa.
Quando o deputado Onofre Agostini (PFL), que presidia o parlamento catarinense, abriu uma sessão extraordinária e colocou o projeto em votação, os debates se acirraram novamente.
O deputado Ronaldo Benedet foi para a tribuna para dizer que o PMDB votaria a favor do projeto, mesmo tendo sido contra o regime de urgência, e chamou atenção do deputado Reno Caramori, que era da situação:
– Passamos o tempo da ditadura. Se alguns não se lembram ou se sentem saudade dela. É tempo de participação, é tempo que a sociedade… Está rindo Deputado Reno Caramori. V.Exa. se acostumou com o tempo da ditadura. Quando era fácil. Mandavam tudo o que bem entendiam. O Parlamento era obrigado a engolir goela abaixo – disse e está registrado na ata.
E Benedet continuou:
– Naquele tempo o Parlamento não representava a sociedade catarinense nem brasileira. Tinha que fazer o que os Coronéis, os Generais mandavam, sob pena de prisão, de cassação de mandatos. Este tempo acabou.
O deputado Afrânio Bopré também reclamou:
– Estão fazendo aqui uma politicagem na Assembleia Legislativa! Nos bastidores, em tom de gozação, eles estão dizendo: ah, Deputado Afrânio, quer dizer que é contra o BID IV! Que bobagem! Ninguém é contra o BID IV! Só que não há urgência!
O deputado Titon, que havia recebido críticas por ter dado o quórum a aprovação do regime de urgência, voltou à palavra para se defender:
– Sou, sim, da Oposição, mas de uma Oposição consciente. Faço política com “P” maiúsculo. Não faço Oposição só para dizer que faço. Há muito tempo deixei de andar de arrasto de alguns que falam por muitos, que acertam por muitos e acertam errado – afirmou.
E na sequência, Titon chamou atenção do seu colega de bancada, Ronaldo Benedet:
– Por isso, Sr. Ronaldo Benedet, eu não sou do lado de lá, como V.Exa. falou daqueles que aqui permaneceram. Não sou do lado do Governo, e não aceitei de cabeça baixa essa questão, não. Aceitei por um princípio, por uma defesa da minha região, por uma defesa dos meus Municípios. Sou muito homem para arcar com as minhas consequências.
Entretanto, o melhor embate se deu entre os deputados Milton Sander, já falecido, e o João Henrique Blasi.
Sander foi à tribuna elogiar Titon:
– Mas, devo fazer dois registros com relação às palavras desse eminente cidadão, que estou aprendendo a conhecer, meu quase vizinho, meu ex-colega Prefeito de Campos Novos, Deputado Romildo Titon.
E prosseguiu, insinuando que o PMDB estava sendo levado a reboque pelo PT:
– Graças a Deus, Sr. Presidente, temos Deputados que honram esta Casa com o seu raciocínio, com a sua lógica, com a sua coerência, com a sua firmeza. Como disse o Deputado João Rosa pode servir de exemplo para que esta Casa, a partir do segundo semestre, na reta final dos nossos mandatos, nesta Legislatura, deixando a demagogia de lado. Mas quando um grande Partido está se deixando levar por um Partido radical, pelo menos tem uma voz coerente que destoa e discorda desta conduta.
Blasi não deixou por menos e saiu em defesa do PMDB:
– Poderia aceitar de qualquer Deputado da Bancada do PMDB qualquer registro crítico, mas não posso aceitar que o Deputado Milton Sander, adversário histórico do PMDB, assome esta tribuna para querer ditar cátedra, para querer ensinar a posição que o PMDB deva tomar nesta Casa. Aceito aqueles que sempre estiveram contra a ditadura, defendendo o estado de direito democrático, este tipo de posição, mas não aceito de quem sempre esteve no outro lado do balcão qualquer afirmação neste sentido”.
Finda as discussões, presidente Onofre colocou em votação o projeto que foi aprovado por unanimidade. Para acalmar os ânimos, em seguida entrou em votação um projeto de autoria do hoje nosso governador Jorginho Mello, que tornava Catanduvas a Capital Catarinense do Chimarrão.
Com projeto aprovado e contrato assinado, o dinheiro do BID veio para Santa Catarina, Amin, mesmo assim perdeu a eleição de 2002 e Luiz Henrique fez os investimentos. Por pura coincidência, até esse humilde repórter acompanhou o governador, em 2005, a Washington, nos EUA, para fazer uma prestação de conta do Programa BID IV.






