Jornalismo e literatura: os livros “de cinema” de Brígida De Poli e as leituras de Carlos Turdera

Esta edição da Coluna Literária de Carlos Stegemann traz o encontro entre jornalismo e literatura nas estantes e nas memórias de Brígida De Poli e de Carlos Turdera. Com arte exclusiva de Luciano Martins, o colunista passeia pela resistência política na ditadura, faz uma defesa enfática da leitura dos grandes clássicos contra os modismos de mercado e apresenta o novo livro infantil de Celso Vicenzi.

Duas perguntas para Brígida De Poli, autora das crônicas que unem as telas e as páginas

Carlos Stegemann traz o encontro entre jornalismo e literatura de Brígida De Poli e de Carlos Turdera, com arte exclusiva de Luciano Martins
Arte de Luciano Martins exclusiva para a coluna.

Façam silêncio, desliguem os telefones celulares e concentrem-se na leitura de “No escurinho do cinema – Memórias de uma cinéfila”, da jornalista e escritora Brígida De Poli, lançado recentemente pela Editora Insular. A autora tem mais de quatro décadas bem-sucedidas de jornalismo, mas a paixão pela sétima arte vem da tenra infância, quando estudava em uma escola salesiana e as sessões de cinema eram a recompensa para os alunos que assistissem à aula de catequese. 

Colunista longeva sobre o tema no portal Making Of, a obra é autobiográfica: as 26 crônicas falam dos seus filmes e diretores favoritos, as cíclicas oscilações do cinema brasileiro e o terrível período da censura durante o regime militar instaurado em 1964. Tudo temperado com emoção e humor. 

Qual a crônica que lhe é mais cara e qual foi a mais difícil de produzir?

“Lembra sua primeira vez”, produzida na década de 1980 e que venceu um concurso da Zero Hora – resgatando quando, com oito anos, pisei em um cinema pela primeira vez e descobri a magia da tela. A partir dali, comecei a me tornar uma cinemaníaca devotada! A mais difícil de produzir, por motivos óbvios, foi a lista dos meus 10 filmes favoritos. Quase impossível… Relacionei os primeiros que me vieram à cabeça naquele momento, porém pode alterar de acordo com o sentimento do dia. O único que não muda é o que ponteia os preferidos — “Amarcord”, de Fellini, que tem uma de suas cenas na capa do livro.

Qual o melhor filme com roteiro adaptado de livro?

Também é difícil de listar, mas recorro à coluna que escrevia para a Revista Paranhana Literário, “O livro que virou filme”, e destaco três: “Fim de caso” (1951), baseado na obra de Neil Jordan; “O cônsul honorário”, adaptado da obra de Graham Greene; e “O Expresso do Oriente”, um clássico entre os clássicos, de Agatha Christie. 

O que está lendo Carlos Turdera

Carlos Turdera é um jornalista e escritor argentino há 13 anos radicado em São Paulo. Radicado em termos, porque está sempre a percorrer a América Latina perseguindo as melhores pautas políticas e sociais para veículos como o La Nación (Argentina), Deutsch Welle (Alemanha), AFP (França) e NTN24 (Colômbia), entre outros. A carreira literária iniciou em 1989, com “Guerra e Imprensa”, e “O Brasil dos Correspondentes”.

Agora, mais imerso nos livros do que no jornalismo, está prestes a lançar “Idas e Vindas”, sobre como cobrir e viver na América Latina como nômade digital em tempos pós-pandêmicos.

Minha última leitura foi “Lady Tempestade”, de Sílvia Gomez (Cobogó), uma reconstrução dramatúrgica da vida e dos diários da advogada Mércia Albuquerque que, após testemunhar em Recife, em abril de 1964, como militares levavam um homem arrastado com uma corda no pescoço e com os pés sangrando, diante de uma multidão que olhava em silêncio, decide defender os perseguidos pelo regime militar, a quem ela chama de “gafanhotos”. Comprei o livro depois de assistir ao monólogo interpretado por Andrea Beltrão e dirigido por Yara de Novaes, que traz uma profunda experiência daquele período, encenando a persistência e sobrevivência daqueles mortos e desaparecidos, ainda presentes. A obra é de difícil leitura para quem, como eu, não está acostumado com texto teatral, mesmo assim transmite uma potência contagiante. 

Eu indico: “Os melhores contos fantásticos”

Nada é mais importante na formação de um bom leitor do que se dedicar aos clássicos. Numa era em que autores badalados pela mídia (por serem engajados em causas sociais) ganham espaços sem a devida qualidade na forma, é para os clássicos que devemos dirigir os nossos olhares.

A antologia “Os melhores contos fantásticos” (editora Nova Fronteira), organizada por Flávio Moreira da Costa, traz dezenas dos melhores escritores da humanidade ou próximo disso: Turgueniev, Guy de Maupassant, Tchekhov, Balzac, Jorge Luis Borges, Edgard Alan Poe, Oscar Wilde, Kafka, Baudelaire, Robert Louis Steveson, Mary Shelley, Dickens, Hans Christian Andersen… Ou alguns menos conhecidos e tão geniais quanto, como o japonês Saki e o uruguaio Horácio Quiroga.

Na companhia do mestre dos contos cruéis, Villiers de L’Isle Adam, e de Théophille Gautier, dono de um texto perfeito. Com espaço para os lusófonos Eça de Queiroz, Manuel Bernardes, Aluísio Azevedo, Guimarães Rosa e Afonso Arinos. Machado de Assis nos brinda com a enigmática história ambientada no distante Sião (atual Tailândia).

Preste muita atenção no microconto de I.A Ireland, um erudito inglês do século XIX — que, em “Final para um conto fantástico”, faz jus ao conceito que costura as 700 páginas do livro. Uma seleção surpreendente, até para os apreciadores do gênero. Leiam! Leiam! Leiam!

Lançamento: O mergulho de Vicenzi e Honaiser no belo e educativo

A parceria entre o jornalista e escritor Celso Vicenzi e a artista plástica Andrea Honaiser prossegue prolífera: a dupla lançou, no início desse mês, o terceiro livro infantil — “O peixe-papagaio junta sua turma pra cuidar da água”, publicado pela Insular. Celso acumula 50 anos de jornalismo, se consagrou como um dos melhores repórteres e redatores de Santa Catarina, e revelou-se um autor sensível e cativante. Honaiser, que concilia a astrologia e a arte, gerou ilustrações em técnicas de aquarela, com as cores e as linhas tão delicadas quanto vibrantes. 

A história versa sobre peixes e outros seres aquáticos que traçam planos para cuidar da água no planeta. Os nomes populares formam um delicioso jogo de palavras e tentam alertar e convencer os humanos a também cuidar do ambiente ondem vivem. Limpa-vidro, badejo-sabão, peixe-lápis, caranguejo-fantasma e tubarão-enfermeiro são alguns dos personagens a aguçar a curiosidade dos leitores. No final do livro, todas as espécies são descritas com seus nomes científicos.

Direto na fonte

“No escurinho do cinema — memórias de uma cinéfila” e “O peixe-papagaio junta sua turma pra cuidar da água” estão disponíveis para venda no site www.insular.com.br 

Onde há leitores, há esperança

A pequena Ester Garibaldi Wagner, de seis anos, estudante do 1º ano do ensino fundamental do Instituto Estadual de Educação, em Florianópolis, brilhou muito no dia 29 de outubro – apesar do clima frio e chuvoso. Ela foi uma das premiadas na iniciativa Estrela da Leitura*, promovida pela Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina (BPE/SC) e Fundação Catarinense de Cultura.

A mãe, Ana, já leva Ester à biblioteca desde o ano passado e é testemunha do amor pelos livros que tem se impregnado na menina. No outro extremo etário, Angelita Aparecida de Melo, assistente social de 57 anos, também foi reconhecida como destaque, tendo lido quase 60 títulos no decorrer de 2025. “Os livros são os meus grandes companheiros: com eles enfrentei momentos difíceis, viajei pelo mundo e conheci muitas culturas”, resume Angelita. 

A equipe da BPE/SC, liderada pela diretora Cléo Schmidt, foi responsável por algumas das mais importantes ações em favor da leitura no ano que se encerra.

*Evento com apoio do projeto ProFRANCA (Instituto Australis) e da Carbo Editora.

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