Marco Temporal: poderes pressionados às vésperas do recesso parlamentar

Na última semana de trabalhos legislativos de 2025, o agro segue ditando o ritmo. O Supremo Tribunal Federal convocou sessão extraordinária para concluir o julgamento do marco temporal – tese crucial para produtores de todo o país.

O marco temporal voltou ao centro da cena política e jurídica brasileira na semana que antecede o recesso legislativo. Em julgamento virtual iniciado na segunda (15), o Supremo Tribunal Federal passou a analisar a validade da Lei 14.701/2023, que restabeleceu o critério do marco temporal para demarcação de terras indígenas — mesmo após o STF já tê-lo considerado inconstitucional em decisão com repercussão geral no ano passado.

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, foi o primeiro a votar e defendeu a derrubada da lei aprovada pelo Congresso. A decisão pressiona os poderes às vésperas do recesso: o julgamento virtual vai até quinta (18), salvo pedido de vista ou destaque.

Enquanto isso, o agro acompanha os desdobramentos com apreensão: o Congresso se despede acelerando pautas e o Executivo celebra números da safra, abertura de mercados e ações tecnológicas para o setor.

Marco Temporal: Gilmar vota contra a lei aprovada pelo Congresso

O ministro Gilmar Mendes, relator da ação que questiona a constitucionalidade da Lei 14.701/2023, votou nesta segunda-feira (15) para declarar inconstitucional o trecho que prevê o marco temporal como critério para demarcação de terras indígenas. O julgamento ocorre em plenário virtual e segue até quinta-feira (18), podendo ser interrompido por pedidos de destaque ou vista.

O marco temporal é uma tese que restringe o direito à terra aos povos indígenas que estivessem fisicamente ocupando o território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Em 2023, o STF já havia rejeitado essa tese ao julgar um caso com repercussão geral. Mesmo assim, o Congresso aprovou a lei, que depois teve vetos derrubados. Agora, o Supremo julga a validade dessa norma.

Além disso, o Senado aprovou uma PEC para inserir o marco temporal na Constituição — movimento paralelo que ainda depende da Câmara.

Entidades que representam o agronegócio e partidos de centro e de direita defenderam o Marco Temporal. Ao STF, esses setores afirmaram que a tese seria o único critério objetivo capaz de trazer segurança jurídica e previsibilidade aos processos de demarcação.

Santa Catarina defende a lei — e cobra do STF

Em sessão anterior, realizada no dia 11, a Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina (PGE-SC) fez defesa firme da tese do marco.

A tese defendida por Santa Catarina é que só devem ser consideradas terras indígenas tradicionais aquelas que estavam sob a posse dos indígenas ou sob disputa física ou judicial no dia 5 de outubro de 1988 – data da promulgação da Constituição Federal.

Da tribuna da Suprema Corte, o procurador-geral, Marcelo Mendes, afirmou que as unidades da federação esperam por uma “pacificação social e institucional” e que “as diversidades regionais e locais de cada um dos estados e das tribos indígenas exigem tratamentos diversos”.

“O que está em jogo é a segurança jurídica e o direito adquirido dos produtores, muitos dos quais vivem e trabalham nessas terras há décadas”, disse Mendes.

A PGE-SC também solicitou que o STF revise a possibilidade de direito de regresso — instrumento que obriga Estados a indenizarem a União em caso de decisões judiciais contrárias. Segundo a Procuradoria, isso pode causar um efeito devastador nas finanças estaduais. Há nove áreas cujas demarcações como terras indígenas estão judicializadas em Santa Catarina, sendo o Estado parte em quatro desses processos.

FPA reage e promete avançar com PEC do Marco Temporal

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) divulgou nota oficial, ontem, reagindo ao voto do ministro Gilmar Mendes.

A FPA reconhece avanços no voto do relator — como a manutenção de pontos considerados fundamentais da lei aprovada pelo Congresso, que asseguram mais transparência aos processos de demarcação e o reconhecimento da validade de títulos de propriedade em áreas ampliadas.

Entre os trechos elogiados, estão: a obrigatoriedade de gravação de entrevistas, regras claras para atuação de peritos, participação dos produtores nos processos, permanência temporária de ocupantes de boa-fé e a retirada imediata de invasores em casos recentes — a partir de 15 de dezembro de 2025.

Mas a bancada do agro manifestou “preocupação com a retirada do trecho da lei que trata diretamente do Marco Temporal”, justamente o cerne da segurança jurídica defendida pelo setor. “Sem um critério objetivo, como o marco temporal, permanecem as disputas fundiárias e a insegurança no campo”, alertou o grupo.

Diante disso, a FPA anunciou que vai intensificar os esforços pela aprovação da PEC 48/2023, que insere o marco temporal na Constituição e “garante segurança jurídica para todos os envolvidos”. A proposta já foi aprovada no Senado e aguarda análise da Câmara dos Deputados.

Conab acelera para os produtores: armazéns em até 15 dias

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) lançou um novo sistema digital que libera códigos de armazéns em até 15 dias — uma antiga reivindicação do setor agropecuário.

Com a modernização, produtores e cooperativas devem ganhar mais agilidade no registro de estoques e operações logísticas. A medida foi bem recebida por associações e parlamentares ligados à Frente Parlamentar da Agropecuária.

A liberação antecipada do CDA não exclui a vistoria a ser realizada pelos técnicos da Conab na unidade, que permanece obrigatória, acrescenta a estatal.

Mapa lança painel dos 500 mercados do agro brasileiro

Para mostrar que não basta abrir mercados, é preciso exibir conquistas, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) lançou um painel interativo que reúne as 500 aberturas de mercado conquistadas pelo Brasil entre 2019 e 2025.

A ideia é simples e poderosa: produtores, cooperativas, tradings, gestores públicos ou pesquisadores conseguem enxergar onde o Brasil abriu porta nova, quais cadeias mais surfaram essa onda e em que países ainda tem espaço pra bater. O painel ajuda a tirar a exportação da conversa genérica e trazer pra vida real da fazenda, do armazém e da indústria, reforçando a tal interiorização da cultura exportadora que o Mapa tanto fala.

A ferramenta, disponível no site oficial do ministério, exibe também os produtos liberados, países de destino e potencial comercial — com filtros por setor, data e região. A mensagem é clara: “abrimos o mundo para o agro brasileiro”.

Safra 2025/26 deve superar 350 milhões de toneladas

A estimativa oficial da produção de grãos no Brasil para a safra 2025/2026 é de 350,4 milhões de toneladas — segundo a Conab. Entre os destaques estão o milho e a soja, com crescimento sustentado, apesar dos eventos climáticos no Sul e no Centro-Oeste.

A estatal monitora os impactos das chuvas intensas e deve atualizar os dados em janeiro.

Banco do Brasil investe em tecnologia contra inadimplência

Com R$ 400 bilhões em carteira de crédito agropecuário, o Banco do Brasil anunciou o uso de inteligência artificial para antecipar riscos de inadimplência no setor. A promessa é monitorar operações de forma preditiva, evitando calotes e refinanciamentos de última hora.

Cerca de 83 mil produtores estão sendo notificados pelo banco para renegociar dívidas, que tenta antecipar problemas com tecnologia e uma comunicação ativa.

A medida também prevê cruzamento de dados climáticos e de mercado — um “olho digital” sobre o campo.

Visão da Semana

Entre o marco e os mercados — o agro empurra o fim do ano

A última semana de trabalhos legislativos não será morna. O STF julga o marco temporal até quinta (19), pressionando os bastidores do Congresso. O agro, por sua vez, entrega resultados: novas estimativas de safra, ferramenta de gestão de risco, mapa global de exportações e mais controle sobre logística.

Santa Catarina, como de praxe, entra em cena com protagonismo institucional e cobrança por previsibilidade. O recesso pode até chegar, mas o campo segue colhendo dados, tomando decisões e se preparando para os desafios de 2026.

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