Nas redes, a fadiga da polarização: engajamento de deputados cai 17% em um ano em dias de manifestação

O Brasil viveu ontem mais um 7 de setembro de manifestações políticas. Mas, ao contrário de anos recentes, o que chamou a atenção não foi o volume das ruas, e sim o esvaziamento das redes. O barulho da polarização, que já dominou a esfera digital, soa cada vez mais baixo.

Os dados da BN3 ajudam a compreender a mudança. Na manifestação de fevereiro de 2024, os deputados federais somaram mais de 21 milhões de interações no Instagram em pouco mais de mil posts. A média era de 21 mil engajamentos por publicação. Ontem, em 7 de setembro de 2025, foram pouco mais de 7 milhões de interações em mais de mil posts, com média de 6,6 mil por publicação. A queda é vertiginosa. E não se trata de um lado ou do outro. A fadiga está por todos os lados.

Considera apenas posts no feed e orgânicos no Instagram. Posts em que as curtidas foram ocultados estão excluidos. Apenas deputados federais em mandato.

Entre presidenciáveis, o padrão se repete. Na manifestação de fevereiro de 2024, cada post recebia em média 285 mil interações. No 7 de setembro de 2025, essa média caiu para 50 mil. O declínio foi de mais de cinco vezes em menos de dois anos. O presidente da República também sentiu o impacto. No 7 de setembro de 2024, Lula alcançou 1,2 milhão de interações. Ontem, foram 726 mil.

Considera sempre os mesmos quadros de presidenciais citados na imagem. Apenas posts no feed e organicos. Posts em que as curtidas foram ocultados estão excluidos.

O dado mais revelador está na engrenagem da polarização. O afastamento de Bolsonaro das redes, determinado pelo Supremo Tribunal Federal, não abriu espaço para Lula. O efeito foi o contrário: reduziu-se o volume do debate. A lógica binária precisa de dois polos para se retroalimentar. Sem a presença contínua de um deles, a disputa perdeu ímpeto.

Esse esvaziamento pode ser lido como sintoma de saturação. Por anos, a polarização manteve o país em estado de alerta, atraindo milhões de pessoas para a arena digital. Mas a repetição do mesmo enredo de nós contra eles passou a produzir o efeito oposto. O público não se mobiliza mais na mesma intensidade. Não porque os temas perderam relevância, mas porque o ciclo se tornou previsível. A política que parecia permanente se tornou redundante.

As pesquisas de opinião reforçam esse quadro. Estudos recentes de institutos de pesquisa têm identificado uma fragmentação crescente das identidades políticas no Brasil. A polarização continua presente, mas já não abarca todos os eleitores como antes. Muitos brasileiros não se reconhecem plenamente nem no petismo, nem no bolsonarismo, revelando um espaço cada vez mais amplo de pessoas que transitam fora dos extremos tradicionais.

Há ainda outro fator decisivo: boa parte do engajamento atual acontece em câmaras de eco. São bolhas conversando consigo mesmas, mas com dificuldade de furar seus próprios limites. O que antes era guerra aberta pelo espaço público digital se tornou manutenção de territórios já conquistados. O resultado é um engajamento mais barulhento dentro, mas menos capaz de ampliar para fora.

A polarização não desapareceu. Continua a estruturar discursos e identidades. Mas perdeu força como motor de mobilização. O que antes era combustível começa a apresentar cansaço. O que já foi sinal de poder nas redes agora expõe exaustão.

Há algo pedagógico nesse silêncio relativo. As redes sociais, que amplificaram ao máximo o embate entre direita e esquerda, estão devolvendo sinais de que as pessoas buscam outros formatos de relação com a política. O engajamento não desaparece, ele se desloca. Sai do barulho para procurar quem oferece convivência, quem mostra rotina, quem consegue envolver na intimidade.

A fadiga da polarização pode marcar o início de uma nova fase. Uma fase em que curtidas e comentários deixam de ser o melhor termômetro da relevância. O que importa é a densidade dos vínculos, não o volume das interações. Ontem, o Brasil viu mais um ato nas ruas. Nas redes, viu mais um episódio de esgotamento de um ciclo.

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