O desafio da fala: Eskudlark une fé e tecnologia para concluir ciclo político na Alesc

A palavra parlamento vem do francês antigo parlement, que significa discussão, diálogo, discurso. Sua origem está no verbo parler: falar, conversar. Não por acaso, a política representativa nasce da palavra, da capacidade de comunicar, ouvir e construir consensos. Para Maurício José Eskudlark, falar sempre foi mais do que um instrumento institucional; foi um modo de atravessar a própria vida.

Jeferson Baldo / Agência AL

Nascido em 18 de janeiro de 1958, em Canoinhas, no Planalto Norte catarinense, Eskudlark aprendeu cedo o peso da responsabilidade. Perdeu o pai aos 11 anos de idade e, como filho mais velho de Dona Juventina, assumiu ainda menino o papel de homem da casa, ajudando a criar os irmãos. Trabalhou como ceboleiro, vendedor de picolés, engraxate e entregador de jornais, enquanto alimentava o sonho de se tornar advogado. Vereador por São Miguel do Oeste em dois mandatos consecutivos, alguns anos mais tarde, em 2006, assumiu pela primeira vez uma cadeira na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), levando consigo não apenas um mandato, mas a experiência de quem sempre precisou se expressar para seguir em frente.

Hoje, ironicamente, é justamente a fala que se tornou um desafio, e também o centro de uma escolha simbólica: o uso da inteligência artificial para manter viva a essência do Parlamento, que é o diálogo.

O diagnóstico e a adaptação

Há cerca de três anos, Eskudlark convive com a Esclerose Lateral Primária (ELP), uma doença neurológica rara e progressiva que compromete a fala, o equilíbrio e a mobilidade. A condição, no entanto, não afeta a memória nem a capacidade cognitiva, ponto que o deputado faz questão de destacar.

Os primeiros sinais surgiram em 2023, com lentidão na mão direita. O diagnóstico inicial indicou Parkinson. Mesmo assim, ele seguiu trabalhando, conciliando a rotina intensa da Alesc com exames e acompanhamento médico.

No início de 2024, novos exames descartaram o Parkinson e confirmaram a ELP. O período de espera até o diagnóstico definitivo foi, segundo ele, o mais delicado.

“O momento mais difícil foi quando voltei de São Paulo e ainda não tinha um diagnóstico certo. Os exames iam levar dois dias para ficar prontos e eu cheguei a pensar que poderia ser Esclerose Lateral Amiotrófica, a ELA.”

Apesar do impacto, Eskudlark afirma que encarou a confirmação com serenidade.

“Sempre tive consciência de que a vida é uma passagem. Deus sabe o que faz. Estou passando por um propósito de vida e procuro viver em paz e da melhor forma possível.”

A inteligência artificial como extensão da voz

Com o avanço da doença e a dificuldade progressiva na fala, surgiu um desafio concreto: como manter a comunicação com a população, elemento central do mandato parlamentar. A resposta veio da tecnologia.

Eskudlark passou a utilizar inteligência artificial para dar clareza à voz em vídeos institucionais, pronunciamentos e mensagens públicas. A decisão não foi pensada para ocultar a condição de saúde, mas para preservar a transparência, a prestação de contas e o contato direto com os eleitores.

“A minha memória está 100%. Quero cumprir o meu mandato até o último dia. Precisávamos encontrar um meio de continuar falando com meus amigos e eleitores. A tecnologia veio para nos ajudar, para ser usada a nosso favor.”

Jeferson Baldo / Agência AL

Para o deputado, a IA não substitui sua presença política, mas funciona como uma extensão da voz, garantindo que o conteúdo, o tom e a intenção da mensagem permaneçam fiéis.

“Eu quero continuar trabalhando, falando com as pessoas, prestando contas. Não é esconder nada. É garantir que a mensagem chegue bem. Continuamos fazendo um grande trabalho por Santa Catarina, cumprindo nosso juramento e compromisso com nossa gente.”

Fé, família e equipe

Ao longo de toda a trajetória, Eskudlark reforça que nunca caminhou sozinho. No enfrentamento da doença, o apoio da família, da equipe de gabinete e das lideranças políticas espalhadas pelo Estado tem sido determinante.

“Temos um gabinete muito bom, uma equipe maravilhosa, prefeitos, vereadores e lideranças que seguem unidos.”

A esposa, Eloísa, é citada como presença constante e fundamental. Além do apoio emocional, ela passou a exercer um papel essencial na rotina diária do deputado: aprendeu a compreender praticamente tudo o que ele fala, auxiliando na comunicação e acompanhando-o diariamente na Alesc, inclusive nas atividades de plenário e gabinete.

A fé também ocupa lugar central nesse processo. “Acredito muito em Deus. A fé dá sentido à vida, força e esperança para superar os desafios” complementa o deputado.

Reflexões sobre 2026 e continuidade política

O diagnóstico também trouxe um período de reflexão sobre o futuro. Após conversas com a família e a equipe, Eskudlark decidiu não disputar a reeleição em 2026, optando por apoiar um nome que mantenha a unidade do grupo político construído ao longo dos anos.

Bruno Collaço / Agência AL

A escolha foi unânime: Solange Schlichting (PL), a Chica, ex-prefeita de Salete, município onde Eskudlark foi proporcionalmente o mais votado nas duas últimas eleições.

“Tínhamos várias possibilidades, inclusive dentro do gabinete, mas a decisão pela Chica foi unânime. Ela tem o meu perfil, conhece nossas bandeiras e tem o respeito das lideranças.”

Segundo Eskudlark, o governador Jorginho Mello teria se manifestado de forma positiva e imediata ao ser comunicado da decisão. “Ele acredita que a Chica será uma deputada estadual muito atuante e humana.”

Trajetória e legado

Antes da política estadual, Eskudlark construiu uma longa carreira na Polícia Civil, iniciada em delegacias de comarca e concluída no cargo de delegado-geral do Estado. Na vida pública eletiva, soma dois mandatos de vereador e cinco mandatos de deputado estadual.

Eleito vereador por São Miguel do Oeste em dois mandatos consecutivos, de 1989 a 1992 e de 1993 a 1996, foi, no segundo mandato, o vereador mais votado da história do município até então, período em que também presidiu a Câmara Municipal, experiência que marcou o início de sua projeção política estadual.

Segundo ele, a atuação sempre esteve baseada na presença nos municípios e no diálogo com lideranças locais.

Somente no último ano, destinou recursos para 117 municípios, alcançando cerca de 200 entidades, com foco em segurança pública, saúde, educação, infraestrutura, APAEs e redes de apoio social.

Enquanto houver palavras

Mesmo diante das limitações impostas pela saúde, Maurício Eskudlark segue exercendo plenamente o mandato e mantendo o contato com a população catarinense. Agora, com o apoio da tecnologia, reafirma o princípio que atravessa sua história pessoal e política.

“Fazer política é gostar de pessoas, saber ouvir, entender e buscar soluções.”

No Parlamento, Eskudlark demonstra que, enquanto houver diálogo, o mandato segue vivo. A voz pode mudar de forma, mas o compromisso permanece.

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