O fim do país do futebol já começou?

Uma decisão política pode mudar o esporte brasileiro fora dos gramados

Houve um tempo em que o Brasil se apresentava ao mundo com uma frase pronta: o país do futebol. Ela explicava tudo e, ao mesmo tempo, escondia muita coisa. Escondia o talento espalhado por outras quadras, pistas, mares e tatames. Escondia também a falta de estrutura que sempre empurrou milhões de jovens talentosos para fora do esporte antes mesmo do sonho começar. Talvez estejamos vivendo um ponto de virada.

A decisão de tornar permanente a Lei de Incentivo ao Esporte não é um detalhe jurídico. É uma mudança de mentalidade. Quando o investimento deixa de ser episódico e passa a ser previsível, o esporte deixa de viver de exceções e começa a funcionar como política pública de verdade. Com planejamento. Com continuidade. Com futuro.

O exemplo está logo ali, quebrando na praia. O surfe brasileiro não virou potência por acaso. O que parecia improviso sempre teve método. Campeonatos de base organizados, apoio financeiro consistente, patrocínios estáveis e presença forte de estatais e grandes empresas ajudaram a criar um ecossistema onde o talento não precisava mais abandonar o mar para sobreviver. O resultado apareceu em sequência: títulos mundiais, medalha olímpica, uma geração inteira formada com método e suporte. Não foi sorte. Foi investimento sustentado.

É exatamente isso que a Lei de Incentivo ao Esporte permanente permite replicar em escala nacional. Quando empresas podem planejar doações ano após ano, elas deixam de “ajudar quando dá” e passam a construir projetos. Quando entidades esportivas sabem que o recurso não vai desaparecer no próximo ciclo político, elas conseguem formar técnicos, manter núcleos, acompanhar jovens e criar trajetórias completas, não apenas histórias interrompidas.

O esporte, nesse cenário, deixa de ser visto apenas como palco de alto rendimento e vira ferramenta de desenvolvimento humano. Forma disciplina, cria pertencimento, ocupa territórios esquecidos e oferece alternativas reais em comunidades onde o Estado quase sempre chega tarde. Ao mesmo tempo, as empresas que entendem esse movimento ganham algo que nenhuma campanha publicitária compra sozinha: legitimidade social, impacto mensurável e reputação construída com lastro.

Talvez o maior ganho seja simbólico. O Brasil pode continuar sendo apaixonado por futebol, mas não precisa ser refém de um único espelho. Pode ser um país de esportes. Um país que entende que talento existe em todo lugar, mas oportunidade não. E que quando a oportunidade vira regra, o talento responde.

A lei está posta. O caminho também. O que se decide agora não é apenas quanto investir, mas que tipo de país se quer formar. Um país de promessas interrompidas ou uma potência esportiva construída com método, tempo e responsabilidade social.

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