O papel das cidades no desenvolvimento do país, segundo o arquiteto Sérgio Magalhães

O arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães veio a Florianópolis durante a semana para falar sobre urbanismo social. Ex-presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), ele deu palestra sobre a implantação do programa Favela-Bairro, no Rio de Janeiro, quando foi secretário de Estado de Projetos Especiais e secretário municipal de Habitação, e sobre o planejamento urbano no país. Em entrevista à coluna, Magalhães disse que as cidades brasileiras não avançaram quando se fala em inclusão e criticou a política rodoviarista. “Há anos o Brasil investe 14 vezes mais em transporte individual do que no transporte coletivo”, afirmou, logo depois do evento organizado pelo Movimento Floripa Sustentável.

As cidades brasileiras estão mais inclusivas ou segregadoras?
Sérgio Magalhães
– Não avançamos muito quando se fala de inclusão, infelizmente. Seja rico ou pobre, a tendência é o isolamento, o que é a “anticidade”, a criação dos Alphavilles da vida, esses grandes condomínios fechados. A cidade, no entanto, deve ser o contrário disso, mistura e integração. Quando as favelas estão conflagradas, temos um gueto urbanístico.

O que fazer para mudar esse cenário?
Sérgio Magalhães
– A primeira coisa é reconhecer a situação e que não é um bom caminho. Isso não ajuda os moradores, o conjunto dos cidadãos, porque uma cidade toda segmentada não é vantajosa para ninguém. Não ajuda na economia do país, porque perde energia,. Não ajuda na democracia. Se tivéssemos políticas consistentes, imagina onde poderíamos estar? Há 40 anos o Brasil patina na economia, é muito tempo para um país com a dimensão do Brasil.

Arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães
Foto: Fabio Gadotti


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Você considera a cidade “um instrumento poderosíssimo para o desenvolvimento do país”. O urbanismo é instrumento importante nesse processo?
Sérgio Magalhães
– Sim. Florianópolis, por exemplo, tem 50% da população sem esgoto adequado. Desses moradores, quantos enfrentam problemas de saúde decorrentes disso? Outro aspecto é a mobilidade. Nas cidades maiores, o cidadão acaba perdendo de quatro a cinco horas por dia para ir ao trabalho e voltar para casa. Imagina se tivesse um sistema adequado, que diminuísse o tempo pela metade. Sobrariam algumas horas para o lazer, para o estudo etc. E isso também impacta na economia, porque são questões que fazem com que as pessoas percam condições de se desenvolver.
Imagine um bairro em processo de decadência, sem acompanhamento adequado, com dominação criminosa. Imagine uma pessoa que tem espírito empreendedor e começa a produzir empadinhas, por exemplo. Apesar do sucesso das vendas, ela não consegue ampliar o negócio pelos problemas de segurança e de mobilidade, etc. Resultado: ela para ou se muda para outro lugar – e nesse caso precisaria de mais investimentos. É um exemplo singelo que pode ser multiplicado por milhões para se ter ideia do que isso significa na economia do país.

Você questiona a prioridade dada os carros no Brasil. Qual o impacto dessa política rodoviarista para as cidades?
Sérgio Magalhães
– Há anos o Brasil investe 14 vezes mais em transporte individual do que no transporte coletivo. Isso significa perdas econômicas para todos. Para quem tem carro, porque as cidades ficam com muito engarrafamento e para quem não tem, porque o transporte coletivo é de qualidade inferior. E a cidade ainda precisa investir recursos, que são escassos, para aumentar as ruas, os estacionamentos, etc. É um dinheiro que poderia estar melhor investido em outros lugares. Além disso, o automóvel tem financiamento integral. Quem quiser, comprar um carro com financiamento. Já para comprar casa não tem isso.
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Na foto em destaque, o centro de Florianópolis. Foto: Cristiano Estrela, divulgação, Secom

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