Por Maria Claudia Goulart
Fatos recentes trouxeram luz à complexa temática sobre o tema Pessoas em Situação de Rua. O emblemático caso do assassinato de um adolescente de 17 anos, cujo ato foi atribuído à um “morador de rua” nos convida a uma reflexão : Como resolver a questão que envolve o crescente número de pessoas em situação de rua?
Em audiência pública realizada no ultimo dia 19 de dezembro na Câmara de Vereadores de Florianópolis, cujo tema foi Moradores em Situação de Rua em Florianópolis, a mãe de Talles Arneiro Neves, adolescente de 17 anos, assassinado na Capital Catarinense em 7 de novembro, relatou: “a pessoa que deferiu golpes de faca no peito do meu filho não era um morador de rua, era um criminoso que foi solto pelo benefício da justiça” (…) “o Jonas tinha 28 passagens pela polícia e uma delas era homicídio, então a gente já não está dentro da pauta, se vocês querem falar de assistência pública, eu não sei o que eu estou fazendo aqui, agora, se vocês querem falar de falta de segurança e leis frouxas, aí eu estou aqui”
Outro crime ocorrido em 13 de dezembro, foi divulgado como assassinato de um homem em situação de rua, nas proximidades do Restaurante Popular. De acordo com a Polícia Militar, que atendeu ao caso, o homem havia sido detido na terça-feira (12) devido a um mandado de prisão em aberto, embora o tipo de crime ao qual estava relacionado não tenha sido divulgado. Após a prisão, ele foi posteriormente liberado, mas as circunstâncias dessa liberação não foram esclarecidas.
Não é de hoje a discussão sobre o perfil das pessoas em situação de rua, há aqueles em situação de vulnerabilidade social, que por advento de alguma contingência social como desemprego, ausência de moradia, ruptura de vínculos familiares, entre outros, encontrem nas ruas o único local possível de sobrevivência. Por outro lado, há foragidos da justiça com mandados de prisão ativo e optam pela permanência na rua, muitas vezes propositadamente de forma itinerante, se caracterizando como aqueles em situação de vulnerabilidade social, continuando a cometer crimes, fragilizando ainda mais aqueles primeiros, que são muitas e diversas vezes, também vítimas desses criminosos, sejam nas ruas ou nos serviços de atendimento ao público, como aqueles da assistência social. E destaco aqui que não me refiro aos egressos do sistema prisional, para eles também há previsão de atendimento em diversas políticas públicas.
A complexidade do tema nos obriga a separar o joio do trigo: Vulneráveis x Criminosos. Sem fazer essa distinção não adianta debate, polêmica ou medidas para equacionar a onda de criminalidade que amedronta nossa cidade e outras cidades de grande porte no Estado.
A partir desta destinção, aos criminosos cabem as punições previstas dentro do rigor da lei. Aos vulneráveis, cabe entender quais razões levaram à pessoa a estar em situação de rua e a partir daí pensar nas ofertas possíveis para interromper esse ciclo e reinserir este indivíduo de volta a sociedade.
Aos criminosos, como cidadã, desejo o cumprimento das leis e a punição e posterior reabilitação social; e se estamos vivendo uma falência do Estado no que se refere à justiça criminal, administração penal e/ou segurança pública, já não sei responder, talvez um especialista ou jurista possa nos elucidar a questão. Mas faço coro junto a Solane Moraes Arneiro Neves, mãe de Talles: não há como entender porque um sujeito com diversas passagens, mandado de prisão ativo, declaradamente delinquente, vive nas ruas, cometendo reiterados crimes e é confundido como uma vulnerável pessoa em situação de rua.
Não há que atribuir o crescimento da população em situação de rua à oferta de assistência pública à pessoas em situação de vulnerabilidade social; ou relacionar a implantação de um serviço que promove segurança alimentar como o Restaurante Popular, que fornece 2000 refeições diárias para diversas pessoas incluindo idosos e crianças à taxa de criminalidade na região, já que a questão não se restringe aquele espaço, mas à toda cidade. Nos casos em que o crime supera a vulnerabilidade social, é preciso intervenção em segurança, não o fechamento de serviços ou diminuição da oferta deles.
Lógico que politicas de prevenção, investimento em educação, etc etc são necessárias.E só assim veremos resultados sólidos, mudanças estruturais e culturais . Mas pra hoje, por hora, para evitar ainda mais tragédias como as citadas inicialmente, é preciso saber separar pessoas em situação de vulnerabilidade, promover as políticas públicas necessárias e não jogar a situação para baixo do tapete, encarar o problema de frente e tratar criminoso com as sanções previstas.
É preciso sim, separar o joio do trigo!
Maria Claudia Goulart é psicóloga, ex-secretária de Assistência Social de Florianópolis (2019-2022) e atualmente ocupa o cargo de coordenadora de Políticas Públicas e Direitos Humanos da Prefeitura de Florianópolis.