Enquanto o governo federal promete R$ 12 bilhões em crédito para salvar produtores afetados por eventos climáticos, a circular do BNDES só deve sair mesmo em outubro.
Até lá, o dinheiro fica preso na gaveta. Já o Banco do Brasil resolveu não esperar e abre caminho com recursos próprios, a partir desta semana. É a diferença entre o discurso oficial e a prática no campo: promessa demais, recurso de menos.

Banco do Brasil sai na frente
Desde ontem, 29, produtores já podem renegociar com o BB em prazos de até nove anos. Não é juro controlado, mas ao menos é caixa girando. A expectativa é de até R$ 20 bilhões renegociados, enquanto o governo ainda revisa normas em Brasília.
Pequenos terão que esperar para acessar os juros de 6% prometidos na linha pública — que, se chegar só em novembro, perde o bonde da safra de verão.
Em Santa Catarina, onde a agricultura familiar pesa no PIB rural, cada semana de atraso no crédito significa lavouras menos tecnificadas e safra mais curta.
Moratória da Soja volta ao Cade
Enquanto os produtores esperam crédito, outro embate promete faísca: hoje, dia 30, a Moratória da Soja volta à pauta do Cade. Para críticos, como o ex-presidente do órgão, Gesner Oliveira, o acordo concentrou poder nas mãos das tradings e virou distorção de mercado. A Aprosoja calcula prejuízo de R$ 20 bilhões ao ano, só em Mato Grosso.
No campo, a safra 2025/26 já mostra pressa: 4,2% da área nacional está semeada, contra apenas 0,5% no mesmo período de 2024.
Em Santa Catarina, a colheita 2024/25 foi recorde, com alta de 20,7% e 7,85 milhões de toneladas. Só a soja respondeu por 3,27 milhões, alta de 19,1%. Produção cheia, mas com preços minguados pela pressão internacional — o produtor catarinense entrega mais e recebe menos.
A guerra dos javalis
Se a soja enfrenta cartel de trading e o crédito emperra no BNDES, o agro catarinense ainda lida com uma praga real que não espera calendário para agir, ou melhor, destruir: os javalis!
Estima-se mais de 200 mil animais espalhados por 236 municípios, devastando lavouras de milho, feijão e soja, além de ameaçar criações de suínos e aves. Entre 2019 e 2024, mais de 120 mil já foram abatidos, mas o problema segue quase fora de controle, como alertou a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina – FAESC.
Num estado que responde por 1,12% do território nacional, mas lidera exportações de suínos e é vice em frangos, a ameaça sanitária é direta: basta um foco de peste suína africana para arruinar cadeias inteiras.
Ironias da safra
Crédito que não chega, soja que vira caso de Cade e javali que destrói o que resta: o produtor rural segue preso entre burocracia de Brasília, distorções de mercado e pragas no campo.
No fim, enquanto o governo promete linhas bilionárias e as tradings defendem vitrines socioambientais, o agricultor continua colhendo a conta — sozinho.