
Há poucos dias, fui conhecer uma nova pizzaria em Floripa. Lugar bacana, chef youtuber jovem e descolado, receitas surpreendentes e uma experiência estilo “take away”. Você pega pra comer em casa ou come ali mesmo sem talheres, disputando espaço nas poucas mesinhas disponíveis – ou batendo um papo com amigos no estacionamento.
Pedi uma fatia e, claro, um vinho pra acompanhar. Só que ele veio num copo descartável de papel, tipo aquele de café para viagem.
Foi aí que meu cérebro bugou: em meio a uma conversa animada, me peguei assoprando o copo. Como se fosse um cappuccino muito quente. Instinto puro. O corpo sabe o que o copo de papel sugere, mesmo quando o conteúdo é outro.
Confesso que, no começo, a experiência foi meio esquisita. A cada gole, uma leve confusão sensorial: o aroma espremido, a borda grossa do papel, a falta de espaço pra girar o vinho no copo cheio – tudo parecia conspirar contra o ritual que tanto defendemos quando falamos de vinho.
E aqui vale abrir um parêntese: existe, sim, um motivo pra tanto protocolo em torno da taça de vinho – e não é frescura. A taça transparente permite ver a cor, o brilho, a limpidez. O cristal, por ser mais fino e neutro, não interfere nos aromas.
Já o formato da taça contribui pra muita coisa. O bojo grande permite a agitação pra liberar aromas, o formato (mais largo embaixo, mais estreito em cima) direciona os aromas diretamente para o nariz, revelando camadas de aromas que não aparecem em outros recipientes, e a haste, por fim, impede que você coloque a mão próxima ao vinho, aumentando sua temperatura.
Ou seja: a taça não é só charme, é ferramenta. Mas, veja bem, nem toda ferramenta precisa estar na mesa o tempo todo.
Naquela pizzaria, ninguém esperava uma taça de cristal entre pratos de papelão e guardanapos engordurados. Ali, a taça estaria completamente deslocada. O copo descartável fez o vinho caber onde, antes, ele não caberia. E quer saber? Achei ótimo.
Porque no fim das contas, o copo de café lembra uma lição simples: não é porque é vinho que precisa ser sério ou complicado. Às vezes vale mais beber vinho num copo de papel do que não beber vinho nenhum. E se for pra acompanhar pizza, melhor ainda.
Tim tim!
Beatriz Cavenaghi é jornalista, doutora em Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e sommelière pela Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-SC). @beacavenaghi no Instagram