No próximo domingo, 27 de outubro, o Uruguai decidirá seu próximo presidente. O país, conhecido por sua tradição democrática e por ser uma das nações mais estáveis da nossa região, agora vê a internet como um campo de jogo fundamental. E não só para mobilizar eleitores, mas para moldar narrativas que podem ser decisivas nas urnas.
O Uruguai é um país de pequenos números, mas de uma grande conexão digital. Com uma população de cerca de 3,5 milhões, o país tem mais de 80% da sua população ativa nas redes sociais, especialmente Facebook e Instagram. Nesse cenário, a disputa entre Yamandú Orsi, do Frente Amplio, e Álvaro Delgado, do Partido Nacional, ganha contornos ainda mais interessantes. Porque, se o embate nas ruas já é acirrado, nas redes sociais é onde as coisas realmente se desenrolam.
Evolução do número de reações, comentários e compartilhamentos – Fonte: Fanpage Karma

O Frente Amplio e a hegemonia digital
Yamandú Orsi chega à última semana da campanha com uma vantagem considerável no mundo digital. O candidato de centro-esquerda domina as redes sociais com uma estratégia bem executada que reflete a complexidade e a segmentação do eleitorado uruguaio. No Instagram, por exemplo, Orsi acumula 200% mais engajamento do que Delgado, e a qualidade de sua comunicação é incomparável. Orsi soube construir sua campanha digital com clareza, e isso inclui uma equipe de redes totalmente baseada na Argentina, algo inusitado, mas que trouxe uma perspectiva regional e altamente profissionalizada à campanha.
Delgado, por outro lado, parece não ter engrenar no ambiente digital. Sua campanha enfrenta falhas básicas de execução: conteúdo mal adaptado, peças criativas repetidas entre plataformas e investimentos em mídia paga que não geram o impacto esperado. A campanha de Delgado investiu menos que a metade dos recursos de Orsi em anúncios eleitorais nas redes. Isso tem deixado sua campanha parecer amadora, especialmente quando comparada à de Orsi. Não é apenas uma questão de falta de engajamento, mas de uma narrativa digital que não conseguiu acompanhar o ritmo da oposição.
Fragmentação de canais e influenciadores em jogo
Um aspecto interessante da campanha de Orsi é o uso de influenciadores e a fragmentação dos canais digitais como estratégia. Enquanto Delgado aposta em uma comunicação mais tradicional e linear, Orsi soube aproveitar os cortes de TV, eventos ao vivo e a criação de conteúdos que se espalham pelas redes com eficiência. Isso demonstra uma compreensão profunda do comportamento digital atual, onde o conteúdo fragmentado e distribuído de forma inteligente consegue amplificar a mensagem. O candidato de centro-esquerda vai dos cliches com cachorros a discursos de Pepe Mujica.
O que dizem as pesquisas?
As últimas pesquisas colocam Orsi à frente, com cerca de 44% das intenções de voto, enquanto Delgado chega aos 24%. Mas o verdadeiro teste será no segundo turno, onde uma aliança entre os partidos de direita pode virar o jogo. Esse é o cenário onde Delgado aposta todas as suas fichas. Em um eventual segundo turno, a soma dos votos da direita poderia chegar a 48%, enquanto o Frente Amplio teria 44%. O desafio de Orsi será garantir que seu engajamento digital se traduza em uma mobilização real nas urnas.
Enquanto isso, o Partido Colorado, com Andrés Ojeda, tenta correr por fora, buscando consolidar-se como uma terceira via, mas as chances de ultrapassar Delgado são pequenas, pelo menos pelas pesquisas mais recentes. Andrés tem um trabalho digital interessante.
As redes como fator decisivo
A realidade é que, no Uruguai, como em qualquer outra democracia moderna, as eleições são decididas tanto nas urnas quanto nas telas dos smartphones. O que estamos vendo é uma disputa onde as redes sociais não são apenas um canal para disseminar conteúdo, mas o espaço onde as narrativas são construídas e desconstruídas em tempo real. Se em campanhas passadas o boca a boca era o que definia os votos, hoje, o boca a boca digital tem um poder transformador — seja em posts no Instagram, vídeos no TikTok ou discussões no WhatsApp.
O sucesso ou fracasso de uma campanha pode ser decidido pela habilidade de transformar engajamento online em apoio real. E essa é a verdadeira batalha que está sendo travada nas eleições uruguaias: a capacidade de gerir não só as expectativas, mas as percepções de cada eleitor conectado.
Na próxima semana, veremos quem soube jogar melhor esse jogo.