Há muitas cicatrizes na relação dos partidos de esquerda em Florianópolis ao longo dos últimos 20 anos que nem mesmo os sorrisos para fotografia conseguem disfarçar. Essa foi a maior constatação da reunião realizada ontem à noite que juntou os pré-candidatos a prefeito Marquito Abreu (PSOL) e Lela Farias (PT) e dirigentes dos partidos envolvidos nas duas composições. A ideia é ainda tentar encontrar o diálogo para uma frente única de esquerda na capital catarinense praticamente às vésperas das convenções do PT e PSOL em Florianópolis, marcadas para a manhã de sábado.
A conversa de ontem veio à reboque da decisão nacional do PSB que tirou o partido do projeto do deputado estadual Marquito, o que resultou no acerto com o PT em Florianópolis. O PSB de Florianópolis já até indicou um nome para a vaga de vice-prefeita, a empreendedora social Ana Carolina Andrade. O discurso, no entanto, é que a vaga está aberta para o PSOL.
Marquito foi o vereador mais votado de Florianópolis em 2020 e ao se eleger deputado estadual em 2022 conseguiu a melhor votação da capital catarinense. Isso faz dele o nome natural entre as lideranças de esquerda na cidade. No entanto, os petistas colocaram na mesa a concessão que fizeram em 2020, quando indicaram o ex-vereador Lino Peres vice de Elson Pereira (PSOL). Na época, Lela Farias era vereador pelo PDT e também abriu mão da candidatura a prefeito.
Aliança de PT e PSOL em Florianópolis não mudou cenários em 2020
A unidade dos partidos de esquerda em 2020 não potencializou os votos – Elson ficou em segundo com menos votos do que tivera praticamente sozinho em 2016, quando PT apoiou a ex-deputada federal Angela Albino (PCdoB). Um segundo lugar de uma eleição vencida por Gean Loureiro no primeiro turno e que apenas manteve a correlação de forças na esquerda: o PSOL com três cadeiras de vereador e o PT com uma.
Na hora de vir pra mesa, aos 45 minutos do segundo tempo das articulações eleitorais, a esquerda de Florianópolis não deixou nenhuma mágoa em casa. A candidatura isolada de Afrânio Boppré (PSOL) ao Senado, que deixou o PSOL formalmente fora da coligação puxada pela candidatura de Décio Lima (PT) ao governo; os apoio petista à candidatura improvisada de Angela Albino em 2016, que recebeu os votos que faltaram para Elson Pereira chegar ao segundo turno contra Gean Loureiro; o avanço surpreendente de Elson em 2012 que botou o PSOL no mapa do poder em Florianópolis, mas tirou Angela Albino de um seguno turno praticamente certo em 2012 contra Cesar Junior (PSD).
A lista de mágoas é quase interminável. Inclusive mágoas geradas na própria conversa de ontem, quando Lela Farias caricaturizou a plataforma política de Marquito ao dizer que “abraçar árvore” e temas como a agroecologia não sensibilizam o eleitor mais humilde. Foi um dos momentos tensos do encontro e gerou muito desconforto no PSOL.
É remota a chance de juntar candidaturas de PT e PSOL em Florianópolis
Tudo isso poderia ser contornado em nome de um projeto único para contrapor a reeleição de Topázio Neto (PSD) atrelado ao PL, o reencontro político de Dário Berger e Gean Loureiro e o PP rejuvenescido de Pedrão Silvestre (PP)?
É possível que sim, mas demandaria tempo, conversa, concessões de lado a lado e disposição para superar cicratrizes que incomodam o campo político há decadas. Parece uma missão impossível para a antevéspera das convenções dos dois partidos, por mais que as atas permaneçam abertas.
Pesquisa têm mostrado que Lela ganha alguns pontos quando seu nome é diretamente associado ao PT e a Lula, algo que a campanha eleitoral oficial vai garantir. A militância do PSOL, no entanto, apresenta capacidade de mobilização espontânea que até agora os petistas e aliados não conseguiram replicar. A disputa eleitoral vai mostrar quem tinha razão (e cada um deve ter a sua). E, possivelmente, gerar novas mágoas.
Foto: Lela Farias e Marquito sorriem em reunião realizada na casa de Guaraci Fagundes, dirigente do PV (Divulgação).