A greve, o sonho, a realidade e o desafio de Jorginho em seu primeiro enfrentamento com o Sinte-SC

Uma das fotos do Sinte-SC da manifestação dos professores grevistas no Centro Administrativo

A imagem produzida pelos professores grevistas da rede estadual, concentrados em frente ao Centro Administrativo e paralisando momentaneamente a SC-401, ainda era inédita no mundo pós-covid. A última vez que o Sinte-SC conseguiu mobilizar parte da categoria para enfrentar o governo estadual remonta a 2015, governo Raimundo Colombo (PSD), quando lutava contra o plano de carreira implantando no início do segundo mandato do pessedista.

Isso significa que não pode ser menosprezada a movimentação desta terça-feira, que teria chegado a 10 mil pessoas segundo o sindicato e a não mais do que 3 mil nas contas do governo. Números importam menos que a imagem. Imagens, números e argumentos, muitas vezes, valem menos do que uma frase simples e direta que conquiste a sociedade para uma causa.

A primeira semana de greve dos professores, por enquanto, fala para bolhas. O Sinte-SC incendeia as redes sociais dos docentes e dos eleitores de partidos de esquerda. O governo, colocando o próprio governador Jorginho Mello (PL) a reagir, engaja o eleitorado mais à direita, antissindical, que o elegeu.

A sociedade, exceto aquela que ficou presa na trânsito, ignora as paixões.

Há um consenso pelo qual poucos lutam de que os professores merecem ganhar mais, merecem uma carreira tão sólida e bem remunerada quanto a dos procuradores, a dos magistrados, a dos fazendários. Fazer isso valer para uma categoria tão numerosa que qualquer acréscimo pontual marca centenas de milhões na folha de pagamento, isso é bem mais difícil de debater fora dos lugares-comuns.

Foto: A manifestação dos professores grevistas do alto, por olhos governistas.
Crédito: Divulgação.

A criação do piso

O movimento deste ano me traz à memória as greves de 2011 e de 2015, ambas no governo Colombo. A primeira pegou o pessedista (ainda no DEM) no susto. Santa Catarina, no governo do antecessor Luiz Henrique da Silveira (PMDB), era um dos Estados que foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o piso nacional da categoria instituído em 2008, no segundo governo Lula (PT).

O STF decidiu, naquele 2011, que penduricalho não era salário e não contava para o piso – que deveria ser entendido, ao pé da letra, como o primeiro nível do plano de carreira dos professores em cada Estado ou município. Foi nesse contexto que uma frase clara e impossível de negar fez aquela greve ganhar adesão e elogio da sociedade, mesmo de gente que nunca apoiou greves.

O governo não paga o piso.

Foram 62 dias de greve em meio a diversos projetos enviados e reenviados pelo governo à Assembleia Legislativa para adaptar o velho plano de carreira dos anos 1980 à realidade da época e de um piso salarial que aumentava sob determinação de outro ente, a União, por critérios considerados generosos demais.

O resultado não agradou ninguém. A diferença entre os professores mais graduados e de mais tempo de sala de aula e aqueles iniciantes ou terceirizados praticamente acabou. Mas a frase que incomodava o governo nunca mais poderia mais ser dita.

Nenhum professor ganhava menos que o piso, mesmo que isso tenha basicamente acontecido graças à extinção dos penduricalhos que eles já recebiam.

Ainda houve uma greve forte, mais de 40 dias em 2012, mas nada comparado à “Histórica Greve dos Professores”, para lembrar o título do livro que o jornalista Moacir Pereira escreveu sobre o episódio. A nova frase resumo do Sinte-SC nunca cativou a sociedade como a primeira.

Precisamos descompactar o plano de carreira.

Esse foi o mote das greves que vieram depois, mesmo a de 2015. Traduzindo do sindicalês, signica garantir que quem trabalha mais tempo e estuda mais possa ter uma remuneração expressivamente melhor. Com essa frase a sociedade até hoje não se engajou para fazer dos professores a prioridade do Estado.

Enquanto for assim, a tal descompactação será um sonho cobrado do governante de plantão.

A vez de Jorginho

O ex-governador Carlos Moisés (Republicanos) nem passou por esse constrangimento. A pandemia do coronavírus primeiro demoveu uma greve em construção, depois resultou na legislação federal que proibiu reajustes salariais por dois anos. Uma “greve sanitária” pela vacinação dos profissionais de educação, chegou a ser anunciada em 2021, mas não foi deflagrada.

Antes dele, Colombo já havia se livrado do assunto por ele e por Eduardo Pinho Moreira (MDB) ao embutir no plano de carreira de 2015 os reajustes salariais até 2018. Ambos deveriam mandar um vinho ao ex-secretário Eduardo Deschamps, da Educação, pela iniciativa.

Por esse tempo todo ausente, a cena desta terça-feira, véspera do Dia do Trabalhador, de um Centro Administrativo tomado por professores, chama tanta atenção. A conta chegou e agora é de Jorginho Mello.

Por enquanto, é uma greve de adesão baixa – menos de 15% diz o governo, o sindicato fala em 50%, mas não há indicativos no dia-a-dia de que haja esse volume de grevistas. O governo acabou fazendo propaganda da greve ao escalar Jorginho em tom incisivo falando em cortar os dias parados e demitir terceirizados.

Foi uma arma poderosa demais para um movimento que talvez tenha até ganhado alguma dimensão e visibilidade justamente na reação ao vídeo do governador. A aposta de conduzir a negociação da greve na Secretaria de Administração, de Vânio Boing, em vez de fazê-lo na Secretaria de Educação, de Aristides Cimadon, como tradicionalmente seria, ainda não mostrou razão de ser.

Foto: Governo e sindicalistas na mesa sem ter o que ceder uns aos outros: suposta negociação.
Crédito: Divulgação.

Não há no movimento grevista deste ano nada que lembre os movimentos de 2011, 2012 ou 2015, fora, é claro, o sonho de ver os percentuais dados ao piso nacional dos professores serem aplicados a todos os níveis da carreira dos docentes estaduais. Um sonho justo para a categoria, uma conta que não fecha qualquer governo (nem mesmo o do petista Tarso Genro no Rio Grande do Sul, que criou o piso nacional como ministro de Lula e sofreu com seus efeitos até mais do que Colombo ao se eleger governador na mesma época)

Por enquanto, temos aqui uma suposta negociação, que resultou em uma foto improvisada com todos à mesa ao final da manifestação. Em toda greve é necessário existir, de parte a parte, margem para ceder. O Sinte-SC e o governo Jorginho ainda não têm.

As redes sociais, no entanto, estas estão incendiadas, cheias de engajamento e discursos ferozes.

É o que parece importar mais.


Foto em destaque: Uma das fotos do Sinte-SC da manifestação dos professores grevistas no Centro Administrativo.
Crédito: Ramon Andrade, Sinte-SC.

COMPARTILHE
Facebook
Twitter
LinkedIn
Reddit